|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Combate' recebe acréscimo
PLÍNIO FRAGA
Editor-adjunto de Brasil
O poeta maranhense Ferreira
Gullar, antigo militante comunista, disse em um recente programa
em um canal de TV paga: "A luta
armada foi a maior cagada de parte da esquerda brasileira".
A argumentação dele era que a
tentativa de enfrentamento do regime militar (1964-1985) por grupos guerrilheiros levou a um embrutecimento da repressão e à radicalização da linha dura, a partir
de 1968.
O personagem, o tema e o raciocínio podem parecer sem sentido
para uma geração que se limita a
conceituar um período de tempo
com a definição publicitária de
"um ano que não terminou".
Por isso, como peça de resistência de uma historiografia restrita,
é preciso ressaltar a importância
do lançamento, dez anos depois
da primeira impressão, de uma
edição ampliada de "Combate nas
Trevas", de Jacob Gorender.
O livro narra como e por que
parte significativa da esquerda
brasileira optou pela luta armada.
O PCB, no qual Ferreira Gullar
militava, era, até a derrubada do
presidente João Goulart, o maior
agente catalisador da esquerda
brasileira e pregava caminhos pacíficos para a "revolução do proletariado".
A escatológica definição do poeta (obviamente ausente do livro)
reflete a divisão da esquerda, tão
bem retratada por Gorender, a
partir do momento da opção pela
luta armada por vários grupos.
Nova revelação
O acréscimo mais importante da
edição é a revelação de um possível encontro entre o guerrilheiro
Carlos Marighella, um dos mais
procurados pelo regime, e o general Affonso Albuquerque Lima,
homem da chamada linha dura,
preterido pelos militares para ocupar a vaga surgida com o afastamento, por sua saúde debilitada,
do presidente Costa e Silva.
O encontro, só agora relatado
por um companheiro de Marighella, é tratado pelo historiador
como uma hipótese de "razoável
grau de veracidade".
Albuquerque Lima teria proposto auxílio na realização de ações
desestabilizadoras do regime, momentos antes da posse de Emílio
Médici, o escolhido dos militares
para suceder Costa e Silva.
Carlos Marighella, por não acreditar na eficácia dessas ações, teria
recusado. Em entrevista ao jornalista Elio Gaspari, colunista da Folha, o filho do general nega o encontro.
Gorender reconhece no trabalho
um "certo coeficiente memorialístico" de militante comunista
que foi. Mas diz que o principal da
narrativa é a pesquisa histórica.
O livro se permite, apesar do tema árido, certas ironias. Seja ao
contestar a possibilidade de a revolução cubana ter-se iniciado do
zero -"Não há começo do nada,
exceto o que os crentes atribuem a
Deus"- ou o caminho do exílio
tomado por certas personalidades
após o golpe de 64 -"Em uns
tantos casos, sem motivação que
não a do pânico".
"Combate nas Trevas" não se
furta ao engajamento tido como
necessário pelo autor, mas é um
dos melhores relatos de um período nacional violento e obscuro, de
ambos os lados.
Livro: Combate nas Trevas
Autor: Jacob Gorender
Lançamento: Ática
Quanto: R$ 27,40 (294 págs.)
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|