São Paulo, Quarta-feira, 19 de Maio de 1999
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Hickenlooper atualiza drama político

em Cannes

"The Big Brass Ring" foi o último roteiro escrito por Orson Welles, com a colaboração de Oja Kodar. O título poderia ser traduzido como "O Círculo do Poder". Como drama político, já nasceu datado.
O roteiro girava em torno de segredos familiares do passado que alimentam a chantagem de um Senador americano com pretensões presidenciais. Nos anos 60, os excepcionais "Tempestade sobre Washington" e "Vassalos da Ambição" já haviam navegado pelas mesmas águas.
Steven Spielberg e Warren Beatty não se interessaram em rodá-lo. Welles morreu em 1985 e o roteiro virou livro. O diretor George Hickenlooper e o crítico F.X. Feeney separadamente mergulharam em tentativas de adaptação. Acabaram unindo forças e o resultado pode agora ser conferido.
O novo roteiro sobretudo atualiza a trama de Welles, transformando-a numa batalha em 2000 pelo governo do Estado do Missouri. Dois candidatos independentes se enfrentam: Blake versus Dix.
Blake (William Hurt) assume o favoritismo com o lema "educação é vida". Às vésperas da eleição, começa a ser chantageado e a sofrer pressão de uma jornalista de TV (Irene Jacob). Os grilhões do passado, aqui, relacionam-se com um ex-senador exilado, Kim Mennaker, que a interpretação insinuante de Nigel Hawthorne quase nos faz esquecer ser um papel sob medida para o próprio Welles.
Mennaker foi padrasto de Blake e de seu irmão quase gêmeo, Bill, desaparecido no Vietnã. A revelação do homossexualismo do veterano senador liquidou sua carreira e levou-o ao retiro em Cuba.
O cineasta Henry Jaglom, um dos parceiros mais próximos de Welles nos últimos anos de vida, atacou violentamente o projeto de Hickenlooper. Errou o alvo. O problema mais grave não está no roteiro, que surge nos créditos como "adaptado" do assinado por Welles e Kodar.
"The Big Brass Ring" peca mais pelo tratamento de telefilme aplicado a uma trama densa, barroca e elíptica. Falta aquele magistral toque expressionista para tornar efetivas as citações imagéticas ao universo de Welles. Cumpre vê-lo -e sonhar com o que um David Lynch não faria a partir de um material como esse. (AL)



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