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Crítica/teatro
Excesso de energia afeta "De Vita Sua"
Atuações viscerais são responsáveis por bons e maus momentos de peça, que tem bela trilha do maestro Roberto Minczuk
LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA
Um dos desafios mais
antigos dos dramaturgos é o de transformar
teses fechadas em ações dramáticas, que aspiram ao imponderável da vida. O espetáculo "De Vita Sua", da Cia da
Revista, é um exemplo claro
dessa dificuldade.
A premiada dramaturga Marília Toledo adapta estudo do
psiquiatra David Levisky, "Um
Monge no Divã - A Trajetória
de um Adolescer na Idade Média Central".
O livro serve-se da autobiografia do monge beneditino
Guibert de Nogent (1055-1125)
para tentar uma psicanálise do
religioso, com foco no período
de sua adolescência.
Conscientes das armadilhas
de uma transposição histórica e
evitando assumir o discurso
autorizado do psicanalista, a
dramaturga e o encenador Kleber Montanheiro optam por
trabalhar mais os aspectos sensoriais do que os racionais na lida com essa saga medieval.
O exíguo espaço de seu Miniteatro é preparado para sugerir
um clima austero e evocar a
gravidade dos mosteiros.
A história começa com uma
procissão que leva os espectadores a um piso superior. Ela
será narrada pelo personagem
central, que ora pontua os sucessivos episódios da trama ora
aparece entranhado na ação.
Tanto a dimensão narrativa como a dramática aparecem contaminadas pela intensidade do
fervor religioso, que situa o
narrador e todos os demais personagens em um registro próximo do transe. Assim, já nos
fatos antecedentes ao nascimento do protagonista, os atores e as atrizes trabalham numa
velocidade alterada.
Com cenas relâmpagos e mudanças rápidas, vai se configurando a dolorida trajetória de
uma criança prometida a Deus
ainda no berço, e chega-se a obter alguma cumplicidade do espectador, dando-lhe margem a
reflexões sobre as circunstâncias existenciais do medievo.
Mas, à medida que se aproxima o cerne da investigação proposta, a adolescência de Guibert de Nogent, a nitidez da encenação vai se rarefazendo até
ela, quase, perder contato com
seu interlocutor potencial.
As pulsões que vão acometendo o monge normando ali
retratado são encarnadas com
fervor pelo ator Marcelo Galdino, que se entrega à proposta de
uma interpretação visceral.
Os melhores momentos do
espetáculo advêm dessa energia, compartilhada por todo
elenco. Mas, ironicamente, ela
também é responsável pela dispersão que desfoca o personagem e rompe o fio que vinha
sendo tramado em torno dele.
Nem a bela trilha do maestro
Roberto Minczuk salva "De Vita Sua" desse malogro.
Talvez seja um problema da
direção, talvez uma limitação
da dramaturgia, que não conseguiu, resistindo a transformar
tudo numa peça de tese, constituir uma ação que ganhasse vida própria.
DE VITA SUA
Quando: sex. e sab. às 21h; dom., às
20h; até 26/7
Onde: Miniteatro (pça. Franklin
Roosevelt, 108, Consolação, região
central; tel. 0/xx/11/2865-5955;
R$ 30)
Classificação: não recomendado para
menores de 14 anos
Avaliação: regular
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