|
Texto Anterior | Índice
LITERATURA
Acusado de injúria racial e incitação ao ódio religioso, escritor dá respostas irônicas em audiência em Paris
Houellebecq vai a tribunal por atacar islã
ALCINO LEITE NETO
DE PARIS
A audiência do escritor Michel
Houellebecq no 17º Tribunal Correcional de Paris, anteontem, deve ilustrar uma das páginas interessantes da história literária da
França no começo do século 21.
Ela durou mais de cinco horas e
reuniu como testemunhas o escritor Philippe Sollers e o dramaturgo Fernando Arrabal, entre outras
personalidades. O tribunal no Palácio da Justiça estava lotado, com
a presença da mídia local e da imprensa internacional. Compareceram, entre outras celebridades,
a escritora Régine Deforges e o cineasta Olivier Assayas.
O interrogatório de Houellebecq foi um espetáculo de ironia e
"non sense". Risos estouravam na
sala por causa das respostas do escritor. Ele é acusado, por três organizações islâmicas e a Liga dos
Direitos do Homem, de injúria racial e incitação ao ódio religioso
contra muçulmanos por declarações dadas à revista "Lire" (Ler).
Em setembro de 2001, por ocasião
do lançamento do romance "Plataforma", ele afirmou em entrevista que "a religião mais idiota é
mesmo o islã".
O processo coloca em questão
as idéias de um dos principais autores do país e toca em problemas
cruciais da sociedade francesa,
como a relação entre a laicidade
republicana e a religião muçulmana. Vivem hoje na França cerca de 6 milhões de muçulmanos,
com problemas de integração.
A sentença de Houellebecq será
dada em 22 de outubro. O escritor
pode pegar 1 ano de prisão e ter
que pagar 45 mil euros de multa.
A promotoria pediu a absolvição
do autor, afirmando que ele não
quis atingir a comunidade muçulmana ao atacar o islã.
Na audiência, o escritor respondeu às perguntas sempre em voz
baixa e desviando a boca do microfone. "Eu jamais manifestei o
menor desprezo pelos muçulmanos, mas sempre tive desprezo pelo islã", disse. Aproveitou para
atacar todas as religiões monoteístas e seus livros sagrados, que,
segundo ele, são "textos de ódio".
Ao ser interrogado, Sollers disse
que é preciso considerar o humor
e a ironia de Houellebecq. Arrabal, baixinho e elegante, tentou
não jurar com a mão direita: "Será
que posso dizer "eu prometo", em
vez de "eu juro'?". No meio do interrogatório, tirou um frasco de
uísque do bolso e brindou ao juiz:
"A vossa saúde, Excelência!".
Texto Anterior: Contardo Calligaris: O sorriso de Fernandinho Beira-Mar Índice
|