São Paulo, quarta-feira, 19 de outubro de 2011

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CRÍTICA DRAMA

Irmãos Dardenne exploram redenção juvenil

No filme de abertura da Mostra, cineastas usam bicicleta como canal para revelar angústias e desejos de menino


NAS PEDALADAS NERVOSAS, PASSAMOS A CONHECER ALGO DESSE MENINO, MAIS DO QUE POR MEIO DE PALAVRAS OU OLHARES


Vincent Kessler - 25. mar.08/Reuters
Os diretores belgas na cerimônia de premiação no Festival de Cannes em 2008

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Do cinema de Luc e Jean-Pierre Dardenne não convém esperar grandes novidades.
Isso é ruim, em especial para a indústria cultural, que vive do novo, mas também pode ser bom, na medida em que é possível detectar não só uma espécie de compromisso com a trajetória de seus personagens como um modo de fazer coerente.
Nesse segundo aspecto pode-se, de imediato, pensar no uso constante das cores quentes, o vermelho em particular: tons que vão muito bem com personagens que parecem estar pisando em brasas.
Mas também pode-se ressaltar a câmera que segue o protagonista muito de perto, como se quisesse entrar na sua pele. Cyril, no caso, é o nome do protagonista em "O Garoto da Bicicleta". Um pré-adolescente deixado pelo próprio pai num educandário. Sem acreditar que isso tenha de fato acontecido, Cyril foge em busca do pai e da sua bicicleta. Obstinado nas fugas, ele também se mostrará obstinado na busca ao pai.
Ainda assim, achará uma tutora, a simpática cabeleireira que o leva para a cidade nos finais de semana. Será mais uma oportunidade para, munido de sua bicicleta, o garoto ir em busca do pai. Ou, então, de se envolver em problemas que a princípio parecem não serem mais do que brigas de rua, mas aos poucos se tornam realmente perigosos.

PEDALADAS NERVOSAS
O que mais importa, nisso tudo, é Cyril de bicicleta. É através dela que se mostram suas angústias e seus desejos. Nas pedaladas nervosas, urgentes, passamos a conhecer algo desse menino, mais do que através de suas palavras ou de seus olhos.
Dali também virá o suspense: afinal, por que ele resiste ao que a sociedade lhe oferece de redenção? Se há um encanto no filme, ele vem daí. Cyril é um mistério que não se revela: quanto mais o observamos, mais nos entranhamos em seu mistério, em seu flerte com o mal, em sua bela incapacidade de resignação.
Ele não deixa de lembrar o menino de "Alemanha Ano Zero" (1948), de Roberto Rossellini (1906-1977), mas não sem diferenças marcantes. O jovem de "Alemanha Ano Zero" perambulava sem objetivo por uma cidade destruída pela guerra.
Cyril, ao contrário, transita por uma cidade tranquila e tem objetivos claros. Embora se percam no meio do caminho e se desviem, suas andanças supõem uma finalidade real.
A questão lançada pelo filme é: entre erros e acertos, conseguirá Cyril chegar à redenção? Vencerá a tormenta que se abate sobre sua vida?
A solução para o final do filme é um ponto delicado: à parte representar redenção ou recaída no mal, à parte ser provisória ou não, é o que tem de arbitrário, de exterior à trama que a enfraquece.

O GAROTO DA BICICLETA

DIREÇÃO Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne
PRODUÇÃO Bélgica/França/Itália, 2011
COM Thomas Doret, Cécile de France
QUANDO amanhã (para convidados), às 20h30, no Auditório Ibirapuera; e dias 24, às 21h50, no Reserva Cultural; 28, às 22h10, e 29, às 14h30, no Frei Caneca Unibanco Arteplex
CLASSIFICAÇÃO 18 anos
AVALIAÇÃO bom


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