São Paulo, quinta-feira, 19 de dezembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA

Caça-níquel natalino tem só "Baile Show" como novidade

DO ENVIADO AO RIO

O que diriam os filhos bastardos de Paulo Francis -estas criaturas da imprensa que não vivem sem assentar o relho do escárnio no lombo do baiano- se recebessem de Papai Noel uma caixa com 40 discos de Caetano Veloso? O bom velhinho seguramente não sairia vivo desse trote.
E para os seres humanos que apreciam, qual a novidade desse balaio? O que tem de inédito? Que diabo de comércio natalino é esse? E o precinho, é bom? Uns cinco salários mínimos, rapaziada.
"Luxo" para os fãs da cumeeira da pirâmide. De inédito tem o "Bicho Baile Show", ao vivo, disco dos anos 70, em companhia da Banda Black Rio. Mandaram tirar as cadeiras do teatro Carlos Gomes e promoveram o xenhenhém dançante. A tal da crítica caiu de pau na época: um disco alienado, para dizer o mínimo.
Caetano acreditava nos deuses que dançam, como havia sugado do cabecismo nietzscheano. Os Paulos Francis de então não perdoavam o samba com a Black Rio em plena repressão braba. Houve quem também visse algum oportunismo artístico do novidadeiro compositor baiano, que antevia, no momento, a fundação do funk carioca, gênero que conta com o seu apreço e consideração.
O achado tem seu valor. Quem quiser agora, porém, tem de levar todo o Caetano. Mais adiante é que a gravadora vai vender os discos isoladamente. A caixa tem ainda o "Muito Mais", coletânea apresentada no DVD-áudio que vem de lambuja. Supérfluo -tiragem de 3.000- para poucos.
O que há de novo, como esmiuça Charles Gavin, músico que se firma como um apanhador vigilante do baú da MPB, é a ourivesaria que foi feita com os discos. A remasterização e remixagem na safra pré-1987 reconstruíram algumas canções. A voz aparece mais firme, os instrumentos são mais intensos e personalizados nos discos de 60 e 70, como no "Tropicália ou Panis et Circencis" de tantos Mutantes. E Caetano & Chico Juntos e ao Vivo", no dia do suicídio do poeta piauiense Torquato Neto (1972), segue velho e tão bom. Independentemente dos adornos tecnológicos.
Mas aqui julga-se a caixa, a coisa, não a obra do homem, que já estava, de alguma forma, na praça. É aquele tipo de produto que nego diz assim: "Para colecionadores". E bacanas endinheirados que pretendem fazer uma graça natalina para a noiva. Os que notarem o dedo de Gavin e suas restaurações terão um papo-cabeça a mais -""você ouviu o "Transa" restaurado?"- para sobremesas caras dos restaurantes metidos de Rio e São Paulo. O resto, seu garçom, é café pequeno. (XICO SÁ)


Todo o Caetano 2002
  
Artista: Caetano Veloso Lançamento: Universal Quanto: R$ 950, em média



Texto Anterior: Música: Caixa reúne 40 CDs e raridades de Caetano
Próximo Texto: Frase
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.