São Paulo, sexta-feira, 20 de janeiro de 2006

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ERUDITO NA MODA

No Ipiranga, saias continuam rodadas

LILIA MORITZ SCHWARCZ
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em meados do século 19, o Museu do Ipiranga pouco lembrava o romântico ato da Independência de 1822. Era conhecido como um museu de etnografia. Nos entornos do museu construiu-se um jardim francês, próprio para a prática do "trotoir".
Mulheres freqüentavam os jardins com suas saias amplas, rodadas e longas, uma leve almofada a arrebitar a parte traseira do corpo, enquanto o espartilho, bem disfarçado, esculpia a silhueta. Tudo fazia parte de um jogo simbólico bem jogado: o de pertencer a uma sociedade que se queria européia. Tudo tinha de parecer natural e esconder o teatro que se realizava sob o sol dos trópicos.
No desfile da Cavalera, as saias continuam rodadas, mas subiram acima dos joelhos; os braços, antes cobertos, agora permitem ver o que já foi indecente; e até o passeio, que na época realizava-se ao cair da tarde, foi feito sob o sol escaldante do meio-dia.
Os viajantes oitocentistas estranharam a cor mais morena da elite brasileira. No desfile, porém, a brancura imperou e só para tentar equilibrar surgiram duas modelos mulatas, duas negras e uma nissei. Também nada de espartilhos, a moda gorducha foi substituída pela silhueta alongada. "São gostos", dizia Adélia, vaidosa personagem de José de Alencar que compartilhava daquela febre de bailes, jardins e desfiles ao ar livre.


LILIA MORITZ SCHWARCZ é historiadora

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