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Crítica/romance
Escritor explora mundo medieval em obra
CRÍTICO DA FOLHA
O entrecho de "Erec e
Enide" pode espantar
os que estão mais acostumados aos enredos vagamente policiais da série do detetive
Carvalho. A trama cerca uma
família e, ao contrário do ponto
de vista mais ou menos único
proporcionado pelo gastrônomo inspetor, a perspectiva aqui
se desdobra em três.
Num dos focos, o especialista
em literatura medieval Julio
Matasanz se prepara, na ilha de
San Simón, para receber as homenagens como professor
emérito -ou seja, conforme ele
diz, apronta-se para "sua morte
como catedrático". A pompa e a
circunstância armadas na ilha
que já foi presídio franquista
são grandes. Até o rei lhe manda uma nota de júbilo.
O segundo ponto de vista é da
mulher de Julio, Madrona Mistral de Pamies, herdeira de família rica e tradicional de Barcelona. Sua vida conjugal transformou-se no acordo tácito, carinhoso, mas sem paixão, que
muitas vezes estabelecem os
casais mais maduros.
Pedro é o terceiro elo familiar. Filho de um irmão de Madrona, morto num acidente
junto com a esposa, foi criado
pelos tios. Médico, casou-se
com uma enfermeira, Myriam,
e, com ela, ingressou nas lides
dos Médicos sem Fronteiras na
América Central.
Se os relatos de Julio e de
Madrona se desenvolvem como monólogos interiores, o de
Pedro é narrado em terceira
pessoa, num ritmo de romance
de aventuras.
Há uma quarta estrutura
narrativa, porém, presente desde o título e que preside, de modo subjacente, as demais. É a
história de Erec e Enide, contada por Chrétien de Troyes, no
século 12. A novela de Troyes,
que Julio examina em sua conferência em San Simón, é a primeira da série arturiana, mas
perdeu prestígio para as mais
badaladas aventuras de Percival e de Lancelote.
Erec, o mais jovem dos cavaleiros da famosa Távola, renuncia às guerras em nome de sua
amada Enide, o que gera a crítica de seus pares. Assim, para
provar tanto seu amor como
seu valor como guerreiro, Erec
deixa a mulher expor-se aos perigos, dos quais ele a defende.
A história de Pedro e de
Myriam é quase toda calcada
na de Erec e Enide, mas o próprio Julio não percebe isso. Para Montálban, a possibilidade
de aventura e de amor verdadeiros parece ser possível apenas às margens do capitalismo
e distante do acomodamento
burguês.
(MARCELO PEN)
EREC E ENIDE
Autor: Manuel Vázquez Montalbán
Tradução: Paulina Wacht e Ari Roitman
Editora: Alfaguara
Quanto: R$ 35,90 (256 págs.)
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