São Paulo, sexta, 20 de março de 1998

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Banda é sinônimo de atitude conformista

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Primeira coisa: rufem os tambores, pois isso só parece acontecer uma vez por milênio no Brasil. A vinda do Oasis significa a raríssima oportunidade de assistir no país ao show de uma banda em momento de topo.
Segunda coisa: isso não necessariamente significa muito. Oasis é banda proclamada e autoproclamada "a mais importante de hoje", mas nem por isso tem muito a ver com o Brasil. Oasis ainda não é coqueluche aqui, não tem Lennon ou McCartney, não fala direto aos humores terceiro-mundistas.
Terceira coisa: Oasis é estereótipo de um tipo de atitude conformista bastante típica do momento político atual. Apropria-se de elementos de transgressão dos 60 e os libera em cenário oposto, de franco pragmatismo -é como se o papa fosse governar Cuba, ou como se Fidel Castro fosse rezar missa.
Mas expressa, com toda força, um ranço de existencialismo entediado, inócuo, bem ilustrado pela mesmice das inúmeras canções pós-Beatles, pós-rock pesado que compõe. É, aí, a banda mais representativa de resíduo de fim de século, zona morta em que as coisas ficam se recusando a acontecer.
Assim, o que permite que Oasis seja considerado transgressor é um fenômeno de uniformização que faz com que "cascas" de atitude possam ser vendidas como reais -raciocínios análogos permitem disfarçar o messianismo do U2 de "rock honesto", ou o conservadorismo de Caetano Veloso de espírito transgressor.
Quarta e última coisa: música é o que interessa de fato, e musicalmente o Oasis é meio meia-boca (como costumam ser vários dos fenômenos de massa do pop -"você só dá valor e amor ao que te cega", já diria Lobão).
Todo mundo sabia, nos 60, que os Beatles eram a grande coisa, a ponto de eles varrerem para o canto da sala a rebeldia ingênua dos Beach Boys, a fúria vanguardista do Velvet Underground, a loucura lisérgica do Love e dos Mutantes.
Oasis é isso de forma mais maléfica, porque reza na cartilha empoeirada dos Beatles, porque pesa mão no rock (predominantemente conservador), porque é feito de meninos mimados de virada de século que se recusam a entrever qualquer futuro, porque olha para o chão em vez de para o céu.



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