São Paulo, segunda-feira, 20 de maio de 2002

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POLÍTICA CULTURAL

Proposta revoga Lei Mendonça e estende patrocínio a "trabalhos comunitários de caráter exemplar"

Projeto modifica lei de renúncia fiscal


SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

De 1996 a 2001, R$ 81,8 milhões devidos em ISS e IPTU na cidade de São Paulo foram destinados ao patrocínio de projetos culturais por meio da Lei Mendonça. O valor é pequeno, se comparado ao total da dotação orçamentária aprovado para renúncia fiscal no período: R$ 219,4 milhões.
Os seis anos correspondem a mais metade do tempo de funcionamento da lei proposta pelo atual secretário de Cultura do Estado de São Paulo, Marcos Mendonça, que foi sancionada em dezembro de 90 e está em funcionamento desde 91.
Autor de projeto que revoga a Lei Mendonça e propõe novo texto com modificações na essência do uso da renúncia fiscal, o vereador Nabil Bonduki (PT) acha que na década em vigor o mecanismo "não democratizou o acesso dos pequenos empreendedores nem contemplou o florescimento cultural na periferia de São Paulo".
São, portanto, dois os eixos do projeto de lei de Bonduki: estender a abrangência da lei para projetos de "cidadania cultural e valores educativos, numa perspectiva mais ampla do que se tem considerado produção cultural" e facilitar o acesso aos recursos para empreendedores independentes.
O segundo objetivo seria atingido através de um fundo suprido com a taxação dos valores captados por projetos de maior envergadura (19% nas captações acima de R$ 150 mil) e de 50% de toda a verba utilizada por instituições culturais que renunciam impostos em benefício próprio.
"Bonduki está bem-intencionado, mas é equivocado o seu projeto", diz Mendonça (PSDB). O secretário afirma que a proposta do vereador petista "busca uma fórmula de financiamento para quem eventualmente não consegue patrocínio" e erra ao "penalizar o produtor cultural, que deverá abrir mão do que captou para financiar outros projetos".
O presidente da Associação dos Museus do Estado de São Paulo, Michel Etlin, também discorda das mudanças sugeridas. "O patrocinador vai desistir de usar a Lei Mendonça. A definição é completamente vaga. Diz que o dinheiro pode ser usado para projeto inovador de cidadania, com efeito multiplicador. Se eu tenho um projeto de renda mínima, por exemplo, então posso usar a lei? É um projeto meramente político com a aparência de ajudar os pequenos empreendedores", diz.
O secretário municipal da Cultura, Marco Aurélio Garcia, afirmou na última sexta, durante seminário que debateu o projeto de lei, na Câmara dos Vereadores, que a idéia é "meritória", mas sugeriu sua apresentação das propostas separadas em dois projetos de lei -um específico para a renúncia fiscal e outro para o fundo de financiamento de projetos.
Garcia citou a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) como uma espécie "modelar" de fundo, baseado em "critérios meritocráticos".
O produtor independente Eduardo Kishimoto, que teve autorização para captar R$ 55 mil pela Lei Mendonça para fazer um documentário sobre o fotógrafo Mário Carneiro, mas não conseguiu levantar o patrocínio, diz:
"O que acho complicado nesse sistema é que você precisa estar muito afinado com as empresas investidoras. Ingenuamente, pensei que um projeto mais barato teria mais facilidade de captar. Talvez seja o contrário. É provável que exista uma facilidade maior para projetos mais bem amparados, com pessoas conhecidas".
Publicamente, Bonduki e Garcia agem de modo a afastar a hipótese de uma situação de conflito no tratamento da questão. No debate de sexta, o vereador disse: "Não queria deixar de fazer referência ao fato de que a nova gestão tem instituído outras formas de gerir a lei" e ressaltou que as avaliações negativas que faz do uso do benefício "se relacionam muito mais ao período Maluf e Pitta que à atual administração".
Garcia tornou a afirmar que, quando assumiu, foi "confrontado com casos aberrantes de utilização de dinheiro público para projetos que não tinham nenhuma consistência cultural e eram muito caros", mas não citou nenhum especificamente.
No ano passado, o secretário anunciou que faria uma auditoria nos dez anos de uso da lei. A auditoria não foi realizada. "Criamos um observatório da lei, para quantificar seu impacto", disse.



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