São Paulo, quinta-feira, 20 de junho de 2002

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A passos de tartaruga


Gravadora lança no Brasil coletânea do grupo de rock experimental Tortoise


MARCELO VALLETTA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Eles vieram a passo de tartaruga, mas finalmente chegaram. Os primeiros álbuns de um dos mais importantes grupos de rock experimental, o Tortoise, saem no Brasil com alguns anos de atraso.
"Tortoise", de 94, "Millions Now Living Will Never Die", de 96, e "TNT", de 98 -este último já aqui há pouco mais de dois anos por meio da produtora mineira Motor Music, que trouxe o quinteto para se apresentar no país-, ganham edição brasileira pela Trama e vêm se juntar a "Standards", álbum de 2001.
O grupo, liderado pelo baterista e produtor John McEntire (também responsável por discos de bandas como Stereolab e Trans AM), chamou a atenção da mídia e de um seleto público em meados da década passada, quando começou a lançar singles por selos minúsculos, até conseguir gravar o CD de estréia. "Fiquei muito surpreso quando a gente começou a ficar conhecido. Nosso primeiro disco realmente soou diferente de tudo o que estava rolando na época", conta, por telefone, o percussionista Dan Bitney, que está na banda desde o início, em 90, quando o trio de hardcore Tar Babies, no qual tocava, acabou.
Surgido em Chicago, "uma cidade um tanto isolada", o Tortoise fez parte de uma cena bem mais amigável e menos sujeita às pressões da indústria fonográfica. "Era uma pequena comunidade artística, muito saudável. Era possível montar uma banda com os amigos e sobreviver tocando em clubes para 300 pessoas", diz.
Com o relativo sucesso, começaram as tentativas de classificar a música do Tortoise. "Chamaram-nos de pós-rock, mas acho que não é um rótulo que funciona muito bem, não diz muita coisa."
Bitney conta que o espectro de influências da banda é bastante largo. "Todos no grupo escutam os mais diferentes tipos de música. Eu, por exemplo, gosto de hip hop mais experimental, como Anti-Pop Consortium, de reggae, muito jazz, especialmente Coltrane, e música brasileira, claro. Minha cantora preferida é a Joyce."
Falando no Brasil, o Tortoise já acompanhou o baiano Tom Zé em uma excursão pelos EUA. "Tocar com ele foi sensacional. É uma pessoa muito interessante, com grandes idéias. Mas foi estranho ser apenas uma banda de apoio, não é a posição em que nos sentimos mais confortáveis", diz.
O grupo acompanhou o avanço da música eletrônica, nos anos 90, e lançou vários singles com remixes de artistas como U.N.K.L.E. e Oval. Célebres produtores do rock alternativo, como Steve Albini e Jim O'Rourke, também retrabalharam canções do Tortoise.
"Foi muito divertido escutar nossa música em drum'n'bass", afirma o percussionista. "É excitante como a tecnologia pode ajudar a música. A primeira vez que usamos um computador para compor foi durante a gravação de "TNT", e isso teve um impacto profundo em nosso trabalho. Só é importante não deixar que o computador controle a música."
Bitney afirma que a banda se reúne em estúdio para começar a preparar seu quinto álbum em um mês. "Nós compomos bastante no estúdio. As canções vão se desenvolvendo na nossa frente, é muito excitante. John irá nos mostrar suas novas idéias, e vamos retomar um trabalho que iniciamos há um ano e que tem um desenvolvimento bastante lento." Não é à toa que, em inglês, tortoise quer dizer "tartaruga"...
O próximo disco dos quelônios deverá se aproximar do espírito do rock progressivo setentista. "Será um conceito bastante diferente. Vamos trabalhar em composições muito longas e experimentais e tentaremos gravar tudo ao vivo, com um equipamento simples. Estamos pensando em gravar apenas três faixas, com uns 20 minutos cada uma", explica.
Sobre outros novos grupos que também trabalham com rock instrumental, como o escocês Mogwai e o islandês Sigur Rós, ele diz que não os considera diretamente ligados à sua banda. "Talvez tenhamos todos uma influência em comum, o Kraftwerk, mas é difícil definir isso." Assim como é difícil definir o som do Tortoise.



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