São Paulo, sábado, 20 de julho de 2002

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SÃO PAULO FASHION WEEK

Forum coloca o Carnaval na passarela e Alexandre Herchcovitch brinca com cores e leveza

Evento põe moda brasileira em discussão

ERIKA PALOMINO
COLUNISTA DA FOLHA

Um comentário muito comum entre pessoas de fora da moda e espectadores em geral é: por que os estilistas fazem aquelas imagens na passarela, que nada têm a ver com a vida real? Ou: você usaria aquelas roupas que são mostradas nos desfiles? O desfile da Forum, na noite de anteontem na São Paulo Fashion Week, é bom tópico para essa discussão. As modelos entraram na passarela com esplendores e adereços de Carnaval, muitos emprestados de famosas madrinhas de baterias.
A coleção, bem comercial, como pede uma marca difusora de tendência, tinha como tema o Carnaval em si, e os detalhes de calças e tops vinham do desenho das roupas das passistas.
Então, o resultado do desfile era uma verdadeira escola de samba, com trilha sonora de baticum e Olodum. Performático, teatral, absurdo. Mas no ponto certo. E olha que esse ponto não era fácil de atingir.
Não foi a primeira vez que Tufi Duek trabalhou com motivos "brasileiros". Foi o primeiro a acionar temáticas nacionais, em 94, quando isso ainda era considerado cafona e fora de propósito. Colonizados, nos acostumamos desde cedo com a idéia de que o que vem de fora é melhor -em especial de Paris, uma herança cultural tão consolidada que dura até hoje.
Claro que os elementos da cultura popular brasileira sempre estiveram aí para quem quisesse ver. Mas o fato de uma grande marca (de jeanswear, sempre vale lembrar) acioná-los é que está a história. Como escreveu a historiadora de moda Anne Hollander, os momentos de virada da moda estão não em o que se usa, mas quem usa.
A partir do advento de Gisele Bündchen, também vale a pena recordar, vem crescendo o orgulho fashion brasileiro, num processo que alcançou um ápice em 2000, no momento batizado "euforia brasileira", quando a chegada da primeira delegação de jornalistas internacionais reforçou os temas nacionalistas entre os criadores. Depois da Copa do Mundo, a moda brasileira ganha novo fôlego.
O acerto da marca de Tufi Duek foi na embalagem. Assim, com sua moda comercial de sempre, seus tops de patricinha, calças palazzo, vestidinhos de festa, brilhos aqui e ali, ele prova que conhece como ninguém sua consumidora (o primeiro passo para o sucesso). Fez, mais do que uma bela coleção, um desfile histórico que ficará na lembrança de todos, criando -algo que a Forum não conseguia há tempos- imagens de moda. Vai vender.
E ter algumas das mulheres mais lindas do planeta com sumários trajes de Carnaval é sonho para qualquer carnavalesco -e a prova era o rosto embevecido de Joãosinho Trinta durante todo o desfile. Tufi Duek foi inteligente. Fez falta o masculino, teria sido gostoso ver esse approach nos homens da grife, e seria bem legal também ver algumas t-shirts com estampas de Carnaval.
A moda brasileira de fato não está na temática, mas no olhar. Prova disso são os melhores momentos da Rosa Chá (nas estampas de índios e no design diferenciado, sem os exageros ufanistas) e da singeleza da Água de Coco, na sensacional leitura do estilista André Lima, que transita com facilidade nos materiais manufaturados, sensualidade latina e acessórios.
E se moda é alienação, Alexandre Herchcovitch é seu maior mestre. Em seu excepcional desfile, ele brinca com cores e a leveza dos elementos infantis, provando um domínio de imagem e do vocabulário de moda que poucos têm. Ele completa 31 anos amanhã, como o grande embaixador do design brasileiro. Sem precisar de verde e amarelo.



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