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CINEMA
1º longa de Ricardo Elias tem boa recepção, e espanhol "Segunda-Feira ao Sol" faz sucesso na competição latina
"De Passagem" abre a disputa em Gramado
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A GRAMADO
"Esse é um filme sobre a amizade", diz o diretor Ricardo Elias,
34, a respeito do primeiro longa
de sua carreira, "De Passagem",
que abriu a competição brasileira
do 31º Festival de Gramado, na
noite de anteontem.
Um Palácio dos Festivais não
totalmente completo acompanhou a história de Jefferson (Sílvio Guindane) e Kennedy (Fábio
Nepô), amigos de infância que se
revêem na periferia paulistana,
onde nasceram, quando surge a
notícia da morte de Washington,
irmão do primeiro e parceiro na
malandragem do segundo.
Os dois jovens atravessarão a cidade de São Paulo de uma ponta a
outra (de ônibus e metrô), para ir
ao encontro do corpo de Washington. A viagem é ocasião para
repassarem as circunstâncias que
transformaram Jefferson em um
formando do Colégio Militar,
Kennedy em um regenerado traficante, ex-interno da Febem, e
Washington em um cadáver à espera de ser reconhecido.
Elias disse que acha "riquíssima" a possibilidade de "o público
ter várias visões sobre o mesmo
assunto", referindo-se ao domínio da temática das periferias urbanas na safra nacional.
Mas afirma que seu filme pretende desassociar periferia e violência, ao mostrar que pessoas comuns, e não apenas bandidos, vivem longe dos centros. "Nasci em
Cidade Patriarca, na zona leste
[de São Paulo]. Quando digo isso,
as pessoas comentam que devo
conhecer bem o universo do crime. Não é verdade. A periferia
não é um lugar de bandidos atirando o tempo todo."
O diretor diz que "De Passagem" procura dialogar com "Rio,
40 Graus", de Nelson Pereira dos
Santos, na maneira de abordar os
personagens infantis, e com "O
Grande Momento", de Roberto
Santos, no modo de "fazer de São
Paulo um personagem". O filme
manteve a platéia atenta até o fim.
Mas o sucesso da abertura de
Gramado foi o espanhol "Segunda-Feira ao Sol", do cineasta Fernando León de Aranoa, que começou a competição latina e fez o
público rir à solta, aplaudir em cena aberta e ovacionar longamente
ao final.
Representante do longa na
mostra, a produtora espanhola
Nuria Atienza disse esperar que,
além de se divertir, o público refletisse sobre o que viu.
O que se vê na tela é um grupo
de trabalhadores maduros, tentando obter um novo emprego e
tocar adiante a vida (amorosa, familiar, social), após o fechamento
do estaleiro em que trabalhavam.
No papel do inconformado,
mulherengo, solidário, mas também agressivo e bruto Santa, Javier Bardem (em desempenho
notável) amalgama o grupo de
amigos e a trama do filme.
Aranoa equilibra o universo
aviltante e desesperançado em
que os personagens mergulham
com diversos diálogos engraçados, uma antológica revisão da
parábola da cigarra e da formiga e
pelo menos uma ótima piada, dita
pelo personagem do astronauta
russo, em pé de igualdade com os
esfarrapados espanhóis.
Trata-se de um diálogo entre
dois amigos soviéticos. "Tudo o
que nos disseram sobre o socialismo era mentira", observa um.
"Mas isso não é o pior. Tudo o que
nos disseram sobre o capitalismo
é verdade", diz o outro.
A jornalista Silvana Arantes viajou a
convite da organização do festival
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