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Cada um por si
Sem curadoria, a Arco, grande feira espanhola, oferece painel de justaposições aleatórias
FELIPE CHAIMOVICH
ENVIADO ESPECIAL A MADRI
Arco espelha a Espanha. A
Feira Internacional de Arte
Contemporânea chega ao 25º aniversário fazendo de Madri local
de aferição do mercado uma vez
por ano. Mas a seriedade cultural
garante ao evento o selo da monarquia. O vasto panorama encerrou-se no último dia 17. Reuniu 278 galerias locais e estrangeiras, distribuídas pelos pavilhões 7
e 9 do Parque de Exposições Juan
Carlos 1º. Paralelamente, realizou-se o 2º Fórum Internacional
de Especialistas em Arte Contemporânea, com 48 sessões.
A arte em um contexto de feira
põe em xeque a necessidade da
mediação do curador. Cada galeria leva uma seleção variada de
obras, sejam de artistas por ela representados ou não. Os estandes
são negociados por metro quadrado e divididos entre uma área
expositiva e um depósito, servindo para estocar o que não coube
exposto ou repor o já vendido.
Assim, cria-se um painel de justaposições aleatórias e cambiantes através das vendas. Lado a lado estão instantâneos de Andy
Warhol e grandes telas de Dokoupil, mas logo Bruno Bischofberger
muda tudo de lugar e entram em
cena pinturas de Clemente ou um
Francis Picabia.
O gigantismo do todo e a abundância das partes libertam as peças da obrigatoriedade do diálogo
conceitual: é cada um por si. As
arrumações variam da limpidez
clínica da japonesa Mssohkan à
exuberância sedutora do valenciano Luis Adelantado. Conforme
avança, o visitante esquece das relações entre o diverso para centrar
a atenção nos elementos isolados
que mais lhe interessam.
A admissão do modernismo
propõe uma tese sobre a história
da arte. Embora o nome da feira
enfoque o contemporâneo, há galerias que só trazem vanguardistas, como a Gmurzynska, de Colônia: Sônia e Roberto Delaunay,
Malevich, Miró, Moholy-Nagy,
Picasso e Torres-Garcia. A continuidade entre as duas metades do
século 20 é reafirmada e possibilita descobertas raras e inusitadas,
como uma seleção de construtivistas russos da década de 1920 e
um cartaz convocatório da revolução surrealista, por Dali.
Entretanto as curadorias também têm espaço. Bordejando o
interior de ambos pavilhões encontram-se "Project Rooms" e
"Futuribles". Os primeiros são
dedicados às individuais e, os segundos, a coletivas de artistas
emergentes. Embora os curadores indicados pela feira possam
convidar quem queiram para tais
seções, as galerias representantes
dos exibidos devem pagar uma
dezena de milhar de dólares pela
participação, limitando-se à liberdade curatorial ao trabalho com
estabelecimentos que possam arcar com os custos. Além disso, todas as obras estão à venda.
Contudo há soluções criativas,
como a divisão de custos entre a
Sala Mendoza, de Caracas, e a
Roebling Hall, de Nova Iorque.
Juntando ambas num mesmo estande, a curadora Julieta González
garantiu a arte experimental.
Fundações espanholas sem fins
lucrativos também se fazem presentes, sejam de Tenerife, Canárias, Burgos, Málaga, Navarra,
Valencia, Cantábria ou Badajoz.
A Caja de Madri mostrou os premiados do programa de bolsistas
"Generación 2004", ligado ao centro La Casa Encendida, pólo da
arte jovem madrilenha.
A multiplicidade de aspectos
envolvidos no projeto da Arco é
reconhecida pela participação da
família real espanhola. O rei Juan
Carlos 1º é o presidente de honra
da feira e, a inauguração, no dia
11, foi feita pela rainha Sofia, cujo
país de ascendência, a Grécia, foi
homenageado neste ano.
A monarquia parlamentar espanhola sinaliza sua adesão a um
projeto de cultura globalizada que
fortalece organismos reflexivos
locais. O dinamismo do comércio
é usado para criar um público nacional para a contemporaneidade
artística por meio da concentração multitudinária de visitantes.
Felipe Chaimovich viajou a Madri a
convite do 2º Fórum Internacional de Especialistas em Arte Contemporânea
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