|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTES PLÁSTICAS
Museu norte-americano
celebra arte que fracassou
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
enviado especial a Dedham (EUA)
Uma celebração do fracasso artístico. Essa é a definição que os
fundadores do Museu da Arte
Ruim (Museum of Bad Art, MoBA) dão à sua entidade -que, em
quatro anos, deixou de ser uma excentricidade das vizinhanças de
Boston e se tornou um evento internacional, com web site,
CD-ROM, catálogo e exposição
em jornais e revistas de todo o
mundo.
"Nós queremos mostrar objetos
que foram tentativas sinceras de
criar alguma coisa bonita, mas que
saíram horrivelmente errados",
diz Scott Wilson, o antiquário que
achou o primeiro quadro do acervo do MoBA, "Lucy in the Field
with Flowers", numa lata de lixo,
em 1993.
Agora, na condição de curador
do MoBA, ele recebe cerca de dez
trabalhos por mês, mas rejeita 90%
deles por mostrarem habilidade
técnica excessiva, por não serem
originais ou "por serem ruins,
mas não do nosso tipo de ruim".
O MoBA paga, no máximo, U$
6,50 por uma aquisição nova.
Durante três anos, o MoBA funcionou no porão da casa do programador de computação Jerry
Reilly e sua mulher, a escritora de
roteiros para filmes infantis Marie
Jackson.
Desde outubro de 1995, tem exposto parte do seu acervo permanente na entrada do banheiro do
cinema comunitário de Dedham,
um prédio art déco em que, há 70
anos, são mostrados filmes de
qualidade, quase todos estrangeiros. Às vezes, o MoBA também expõe em restaurantes.
Reilly é o responsável pelo museu virtual (achado no endereço
http://www.glyphs.com/moba/),
um excelente site na Internet, que
é comparado ao do Louvre por especialistas em computação.
O site recebe, em média, 5.500 visitantes por mês. Também foi ele
quem fez o CD-ROM, que já vendeu cerca de 2 mil cópias em 18
meses.
Jackson (que ganhou um prêmio
no Festival de Berlim pelo roteiro
de "The Bulldozer Brigade") cuida da "newsletter" (circulação de
2 mil cópias mensais), escreveu o
catálogo do museu (11.500 cópias
já vendidas) e faz contatos com
jornalistas.
Reportagens sobre o MoBA já
saíram em jornais e revistas de
quase todos os países da Europa e
do Japão. A Folha é o primeiro da
América Latina a registrar sua
existência, segundo ela.
O MoBA tem cerca de 300 "amigos" registrados, com carteirinha,
que contribuem para mantê-lo vivo, e poucos inimigos declarados,
a maioria entre historiadores da
arte ou acadêmicos.
Artistas em geral gostam do MoBA, assim como instituições de arte estabelecidas (o Museu de Belas
Artes de Boston vende o catálogo
do MoBA em sua loja, e seus curadores trocam experiências com
Wilson, Reilly e Jackson).
Para quem pergunta se o MoBA é
uma brincadeira, seus dirigentes
têm uma resposta padrão: "Essa
instituição trabalha duro e bastante para construir o melhor estabelecimento de arte ruim do mundo.
Nós encaramos nossa missão com
muita seriedade. Francamente, ficamos chocados e indignados com
essa insinuação maldosa sobre
nossos edificantes propósitos".
Nenhum dos três faz dinheiro
com o museu. O que arrecadam
com a venda dos CD-ROMs e dos
catálogos talvez consiga apenas
pagar o custo de produção. Quando fazem leilões, todo o dinheiro
arrecadado é doado para o Exército da Salvação (em homenagem às
lojas de quinquilharias que essa
instituição costuma manter).
Apesar de estar obtendo uma excelente mídia (entre as publicações
que deram reportagens de primeira página ao MoBA, estão "The
Wall Street Journal", "The Guardian", de Londres, e "Entertainment Weekly"; os programas
"CBS This Morning" e "Today
Show", da NBC, transmitiram de
Dedham para todo o país), Jackson diz que não se esforça muito.
Ela manda releases das atividades do museu só para os meios de
comunicação de Dedham e Boston. "Os outros vêm porque ouviram falar e gostaram da idéia."
A comunidade de Dedham adora
o MoBA. Uma das mais antigas cidades dos EUA (seus 23.730 habitantes detestam que a chamem de
subúrbio de Boston), à beira do rio
Charles, 19 km a sudoeste de Boston, Dedham teve seu último motivo de fama internacional na década de 1920, quando Sacco e Vanzetti foram julgados no Tribunal
do Condado de Norfolk.
Além do MoBA, Dedham só é conhecida porque se localiza, em seu
território, a casa mais velha ainda
de pé dos EUA, a Fairbanks House,
de 1636.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|