São Paulo, quarta-feira, 21 de abril de 2010

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MÚSICA

Crítica/"Ray Charles Live at the Olympia"

Teclado vulgariza obra de Ray Charles em show improvisado

Greve no aeroporto obrigou cantor a viajar sem o piano para a apresentação, de 2000, que é lançada em CD e DVD

VINICIUS MESQUITA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Não se iluda com a capa do DVD e do CD "Live at the Olympia", gravado por Ray Charles na casa de shows parisiense em 22 de novembro de 2000 e lançado neste ano no Brasil. A imagem que ilustra os dois produtos mostra o músico sentado ao piano. Mas esqueça o instrumento. Durante 14 composições (setenta minutos), Ray Charles manobra um ruidoso teclado Yamaha e tem ao seu lado somente um baterista (Peter Turre), um guitarrista (Bradley Rabuchin) e um baixista (Thomas Fowler).
Não culpe Ray Charles (1930-2004) pelo engodo. O músico fez tudo o que esteve ao seu alcance para chegar a tempo ao Olympia naquela noite.
Em tour pela Europa, Ray, a orquestra e as indispensáveis cantoras do The Raelettes, grupo responsável pelos backing vocals da banda desde os anos 1950, foram surpreendidos com uma greve no aeroporto de Lisboa. A paralisação atingia exatamente a companhia aérea que deveria conduzir toda a comitiva de Ray até Paris.
Cancelar o show era algo inimaginável. O Olympia tinha um poderoso valor sentimental para o músico. Foi lá que ele fez a primeira apresentação na Europa, em 1960. Coube ao produtor Jean-Pierre Grosz criar soluções para o problema (nos extras do DVD, Grosz conta a história em detalhes).
Após uma reunião, ficou estabelecido que Ray viajaria para a França somente com um assistente, um produtor, um responsável pela técnica e três músicos. As salvadoras sete poltronas foram encontradas a muito custo por Grosz em um voo da Air France. Em Lisboa, ficaram a orquestra, as Raelettes e o piano.
No Olympia, o show beirou o nonsense. Em um palco enorme, Ray assumiu o primeiro plano com o Yamaha, deixando na "cozinha" o trio ganhador das passagens aéreas. Os efeitos especiais do teclado, sem a proteção dos demais instrumentos da orquestra, vulgarizaram canções como "Georgia on My Mind", "Stranger in My Own Home Town", "Angelina" e "Hey, Girl".
O Yamaha não prejudicou "I Got a Woman" e "What'd I Say?", mas o resultado teria sido mais bacana caso Ray tivesse à disposição teclados como o Wurlitzer ou o Fender Rhodes, suas opções preferidas antes dos anos 1990.
O DVD convence mais que o CD. Nele, ao menos, você pode entender o milagre produzido por Ray. Com o grupo esfacelado, sustentado por arranjos elaborados na última hora, o músico apelou às vozes da plateia para ajudá-lo com os backing vocals de "What'd I Say?" e, como prêmio, recebeu aplausos de um público satisfeito.


RAY CHARLES LIVE AT THE OLYMPIA

Artista: Ray Charles
Lançamento: Som Livre
Quanto: R$ 29,90, o CD, e R$ 39,90, o DVD
Avaliação: regular




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