São Paulo, sexta-feira, 21 de maio de 2010

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Peça sobre ruína lidera invasão russa em SP

"Casting", primeira montagem de texto de Aleksandr Gálin, estreia hoje

Dramaturgo retrata pessoas que tentam sair da Rússia a qualquer custo e permite paralelo com autores clássicos já em cartaz


GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Já faz 19 anos que a União Soviética foi extinta e os russos ainda comemoram uma sensação atípica de liberdade. Esse sentimento é especialmente presente entre artistas traumatizados pela censura do antigo regime, diz Aleksandr Gálin, dramaturgo contemporâneo russo encenado pela primeira vez no Brasil -a partir de hoje no Sesc Vila Mariana.
Ainda assim, sua peça -dirigida por Marco Antônio Rodrigues e com Caco Ciocler no elenco- fica distante de ser condescendente com uma nova situação política. O título em inglês ("Casting") já aponta a intenção da sátira.
Seu enredo revela um cenário de ânimos exaltados. Mostra um povo que ainda procura assentar tranquilidade com as novas possibilidades, representado por um grupo de mulheres à beira da histeria, dispostas a tudo, ou a quase tudo, para deixar a Rússia. Vale, por exemplo, se arriscar em shows de striptease num incerto destino em Cingapura, ou enfrentar situações que sugerem prostituição -o que não fica explícito no texto. "São pessoas comuns tentando ser livres", defende o autor.
A descrição do cenário, igualmente, retrata um país que tece caminhos sobre ruínas. Tudo se passa num grande e velho cinema de Moscou chamado Cosmos, referência tanto a um instrumento de propaganda comunista para as massas como -por conta do nome- à corrida espacial empreendida durante a Guerra Fria. Quem vence o embate, na situação proposta pela peça, no entanto, é um time de japoneses que chega à Rússia para recrutar garotas bonitas e jovens. Como boa comédia, o texto parte de um primeiro conflito: entre as candidatas, fazem maioria as feias e as velhas.
Há o risco, num primeiro momento, de um traço estereotipado, que Rodrigues sabe bem trabalhar por meio de sua linha brechtiana ligada ao circo. E o retrato de Gálin, de qualquer forma, também parte de uma situação real.
O autor diz que testemunhou, em um teatro tradicional da cidade, um recrutamento da mesma espécie, empreendido também por japoneses, nos dias que seguiram a queda da União Soviética.
"O teatro estava vazio, e dois homens e um tradutor, atrás de uma mesa, olhavam para duas russas seminuas", conta.

Saber rir
É em boa hora que chega a São Paulo um exemplar russo contemporâneo. Especialmente para os entusiastas, é possível hoje fazer um bom paralelo com a densidade de autores clássicos -Tchecov e Dostoiévski- que estão ou entrarão em cartaz em breve (veja ao lado a programação).
Além da adaptação de "O Idiota" para os palcos, com direção de Cibele Forjaz, que vai iniciar turnê pelo interior paulista, começa um especial em homenagem aos 150 anos de nascimento de Tchecov.
Quem realiza o evento é a Caixa Cultural, com programação de leituras, espetáculos e debates. Também em cartaz, Celso Frateschi encena adaptação para "O Grande Inquisidor", trecho de "Os Irmãos Karamázov", de Dostoiévski. O diretor Marco Antônio Rodrigues até arrisca uma comparação. "Ainda há no texto de Gálin aquela vontade de deixar o lugar em que se vive, de ir embora", diz, em referência especialmente à peça "As Três Irmãs", de Tchecov. A escolha de Rodrigues também rastreia uma possível afinidade cultural entre russos e brasileiros. "São povos que sabem rir de si mesmos", resume.


CASTING

Quando: sex. e sáb., às 21h; e dom., às 18h; até 20 de junho
Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, tel. 0/xx/11/5080-3000)
Quanto: R$ 30
Classificação: 16 anos




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