São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA

Grupo soma militância e produção sofisticada

DA REPORTAGEM LOCAL

Nem tudo é notícia ruim na MPB. O selo independente Rapsoulfunkrecords traz a boa novidade gravada em "Antigamente Quilombos, Hoje Periferia", do grupo de hip hop Z'África Brasil. Se o rap é um dos vários gêneros musicais que padecem de desgaste crônico no Brasil, então o Z'África Brasil é o antídoto, em várias frentes.
Para começar, o grupo prega a reunião dos velhos e hoje muito esquecidos quatro elementos constituintes da cultura hip hop. A primeira faixa, "A Raiz", já faz o manifesto pela rearticulação entre mestre de cerimônia, DJ, dançarino de rua e grafiteiro (embora lá adiante, em "O Dom da Rima", vá se reivindicar o beatbox como um "quinto elemento" do hip hop).
Na mesma introdução, um sample da sambista de raiz Ivone Lara indica outra das intenções que farão desse um grande disco: a cultura brasileira como um de seus referenciais centrais.
Ela voltará em diversos momentos, quase sempre orientada pela fusão África-Brasil que Jorge Ben pregou em 1976 e que o Z'África Brasil empurra para a frente em raps enfezados como a faixa-título (surpreendente também pelo uso de teclados) e a ritual "O Rei Zumbi", que fecha o disco.
Mas não se pense em reserva de mercado ou nacionalismo rapper. A produção de Érico Theobaldo, da bela dupla eletrônica Autoload, tira o hip hop do habitual limbo monocórdico de parcas produções e cria um ambiente diversificado, novo a cada faixa.
"Mano, Chega AÍ" lembra A Tribe Called Quest lembrando Lou Reed; "Sapo na Banca" é verdadeiro parque rapper de diversões; "Hip Hop Rua" parece gangsta, sem ser; "Tô Ligeiro" dialoga com o SNJ, outro dos inspirados grupos paulistas de rap.
O direito à diversão, sempre marginalizado pelo rap, faz da já citada "Mano, Chega Aí" festa sem margem à culpa. "Quem diz que na periferia não dá pra curtir?", pergunta a letra.
E tudo isso quer dizer que a politização própria do rap está diluída no Z'África? Não, de modo algum. Entre terrores ("Rima Atômica") e militância black ("O Rei Zumbi"), ressalta-se a furiosa "A Cor que Falta na Bandeira Brasileira". A cor que falta é a vermelha, do sangue vertido na periferia. "Pátria amada, salvem-se, salvem-se", perverte a letra, antes de a batida meio pancadão raptar um sampler do "Hino Nacional". Faltou dizer alguma coisa?
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


Antigamente Quilombos, Hoje Periferia     
Grupo: Z'África Brasil
Lançamento: Rapsoulfunkrecords
Quanto: R$ 25, em média



Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: "O Grande Circo Místico": Dança aérea traz magia para a cena
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.