São Paulo, domingo, 21 de junho de 2009

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Quase brasileiro, Cassel surfa e filma

Após "À Deriva", ator francês roda em setembro fita baseada em livro de Paulo Coelho e prepara comédia para 2011

"Acho que aqui [no Brasil] tem uma coisa de alegria e tristeza, sempre junto, não sei, como uma poesia", diz o ator em entrevista


FERNANDA EZABELLA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Vincent Cassel é o clichê do francês que se apaixona pelo Brasil e, de quebra, vira a paixão de muitos brasileiros (delas, principalmente).
Mas Cassel, 42, é ator de prestígio, sem medo de subverter clichês. Anteontem, num hotel luxuoso de São Paulo, distribuía seu português quase perfeito a quem quisesse ouvir.
"Um café, por favor. Expresso, sim?", disse Cassel a outro francês, que organizava a entrevista com a Folha.
O café veio, e Cassel não o tocou. Falava animado sobre cinema, usando mãos e muitos sorrisos. Ao final de 40 minutos, o café continuava intacto. Não quer pedir outro? "Não, não, tá perfeito, eu gosto frio mesmo", disse, antes de falar dos cafés gelados de Roma.
A simpatia lembra logo seu personagem Matias, escritor que passa férias na praia com a mulher e os filhos, no drama brasileiro "À Deriva". É como uma família de comercial de margarina, mas que, vista de perto, se revela não tão normal.
Ainda neste ano, Cassel faz mais um filme no Rio e, na sequência, produz uma comédia na cidade, a ser estrelada por ele e pela italiana Monica Bellucci, 44 (leia mais abaixo), com quem é casado desde 1999.
No momento, divulga outro longa, desta vez franco-canadense, que é a primeira parte da cinebiografia do lendário marginal francês Jacques Mesrine, "Inimigo Público nº 1 -Instinto de Morte".
Pouco conhecido fora da França, Mesrine (1936-1979) foi acusado de três assassinatos, embora tenha dito em autobiografia ter matado mais de 40. Nada ficou provado, e ele acabou morto alvejado pela polícia após provocá-la demais.
Aqui, Cassel está quase irreconhecível. Engordou 20 quilos, está cabeludo, de cavanhaque e lentes escuras, uma transformação radical que, segundo ele, todo ator sonha em fazer uma vez na vida.
"O problema é que você tem que brigar com sua natureza [para engordar]. Precisei de ajuda [de um médico], eu sou seco, magro", diz Cassel, ator de "Irreversível" (02) e "Senhores do Crime" (07). "Mas você também já está na personagem, caminha diferente, a voz e a respiração mudam."

"Ah, o Brasil"
Após a longa experiência vivendo um bandido -foram quatro meses engordando e nove meses filmando- Cassel veio se refugiar no Brasil.
"Depois do filme, aluguei uma casa no Rio e fiquei quase seis meses no Brasil. Queria desintoxicar, curtir a vida, andar na praia, surfar", disse, acrescentando que, na sequência, filmou "À Deriva".
A paixão pelo país, ele explica, começou pela música e pelo próprio cinema. "Acho que tinha cinco ou sete anos, meu pai [o também ator Jean-Pierre] me levou pela primeira vez ao cinema e foi para ver "Orfeu Negro'", conta. "Mais do que tudo, foi a música do filme... Porque eu não entendi [o filme] direito, mas, dez anos depois, quando encontrei coisas de Caetano Veloso, João Gilberto, eu já reconheci, foi uma coisa natural. A partir desse momento, sonhei em viajar ao Brasil."

Pivete
O pretexto para voar até Salvador foi a capoeira. "O Pelourinho, 23 anos atrás, era um gueto total, o Olodum na rua, o cheiro de dendê, fiquei assim", diz, levando as mãos ao ar.
Mais tarde, apresentou a cidade à mulher, "como um teste", brinca. "Na primeira vez, ela gostou muito, e na segunda vez, ficou muito triste porque via muito pivete na rua, o crack, essa realidade", diz. "Ela não queria voltar por um tempo, mas eu continuei vindo sozinho, e agora ela vem também."
"Acho que aqui tem um misto de uma coisa muito leve e uma coisa muito pesada. Um sentimento de viver um momento de uma maneira mais verdadeira", diz. "Uma coisa de alegria e tristeza, sempre junto, não sei, como uma poesia."
E ao fazer cinema, o que muda rodar em países tão diferentes? "Nada. No final, entre "ação" e "corta", é tudo a mesma merda", diz. "Você está sozinho, você tem que atuar e acabou. O resto não é importante. Porque a coisa mais forte do cinema é esse momento, a magia acontece lá ou não."


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