São Paulo, sábado, 21 de julho de 2001

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AMÉRICA DO SUL

Relato tem 1ª versão brasileira e será filmado por Walter Salles

Diário de Che faz do leitor cúmplice e voyeur

FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Guarde bem a impressão marota do meio sorriso na foto da carteirinha acima; ela é a primeira que fica ao ler "De Moto pela América do Sul", que a Sá Editora acaba de lançar, em primeira tradução autorizada no Brasil pela casa italiana Feltrinelli, que detém os direitos do texto.
O livro nos leva até 1951, quando, num quintal em Córdoba, Argentina, Che Guevara, um curioso garoto de 23 anos, tem a idéia, com o amigo Alberto Granado, de ir até a América do Norte.
Foi assim que "La Poderosa 2" -a então já velha moto Norton 500 de Granado- foi alçada a "cavalo" desses dois "reconquistadores" do continente americano, a partir do começo de 1952.
"La Poderosa" não aguentou o tranco e entregou os pontos já no Chile, segunda escala do roteiro que começara na Argentina e passaria ainda pelo Peru, Colômbia e Venezuela, incluindo entrada clandestina e involuntária no Brasil, pelo rio Amazonas, a bordo da balsa em que rumavam à cidade colombiana de Leticia.
O livro (que também nos faz sentir voyeurs, uma vez que já sabemos o fim do sonhador Che) foi reelaborado pelo viajante depois de sua volta a Buenos Aires, em setembro de 52, vindo de Miami, para onde seguira, deixando Alberto em Caracas, Venezuela.
Talvez por isso nem todos os lugares ganhem uma descrição detalhada no relato de Che (existe ainda o de Alberto, cujos direitos a Sá também comprou, mas ainda não tem previsão de lançar).
Por exemplo, a Bolívia é mencionada apenas como breve parada, durante a navegação pelo lago Titicaca, de cuja margem peruana saíram Alberto, o "grande Che" e "pequeno Che", o Guevara (a partícula "che", explica uma das notas, designa camarada, na Argentina, e ficou sendo usada nos outros países latino-americanos para chamar os argentinos).
Seria, 15 anos depois, o país em cuja selva Che morreria.

Che inspirador
A mistura de curiosidade juvenil e ímpeto revolucionário encontrada no jovem Guevara conquistou, antes da edição brasileira, o cineasta Walter Salles.
"Li pela primeira vez "De Moto pela América do Sul" há quatro anos, na versão italiana. Fiquei fascinado com aquele relato. É uma surpreendente viagem iniciática, que desvenda toda uma geografia física e humana que nos é própria, a do continente latino-americano", diz Salles, que vê no texto "um pouco um encontro entre "Easy Rider" e "O Capital'".
O convite para levar a viagem às telas veio, conta o diretor, de Robert Redford e seu produtor Michael Nozik, há dois anos.
"Desde então, foi desenvolvido todo um processo de pesquisas e de elaboração de roteiro, cuja primeira versão ficou pronta há pouco." O autor do roteiro é Jose Rivera (egresso dos laboratórios de Sundance, onde a idéia de "Central do Brasil", maior sucesso de Salles, foi premiada).
O diretor explica que o filme será uma ficção a partir do livro, com informações vindas de entrevistas feitas pelo jornalista Gianni Miná (editor da versão italiana do diário) com Granado -que, aos 78, vive em Cuba, para onde foi atendendo a convite da Revolução para a pasta da Saúde.
Salles anunciará as próximas etapas do projeto no Festival de Veneza, em agosto, mas adianta que os atores serão latinos (ele pediu que o filme fosse em espanhol) e a escolha do elenco e locações começará até o fim do ano.



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