São Paulo, segunda-feira, 21 de agosto de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Eclipsado na cena pop, coração roqueiro resiste

DA REPORTAGEM LOCAL

Se ele cuidar mesmo do coração, de resto tudo é motivo de alegria. Sem gravadora desde 1996, quando lançou (mais) um disco retrospectivo pela PolyGram (hoje Universal), um dos nomes mais importantes da história do rock'n'roll brasileiro está finalmente voltando.
A obra é da Abril Music, que se por um lado vende tramóias como Twister, Latino e Axé Blonde por outro também tem dado abrigo a gente importante como Mundo Livre S/A, Ira! e, agora, Erasmo Carlos.
Este, não custa lembrar, é valor sempre eclipsado na genealogia da música pop brasileira -em grande parte, devido à parceria peso pesado com Roberto Carlos.
OK, nos anos 60, os da jovem guarda, não tinha para mais ninguém além de Roberto. No início secretário do trambiqueiro Carlos Imperial, depois crooner do nada importante conjunto The Snakes e, por pouco tempo, do crucial grupo de iê-iê-iê Renato e Seus Blue Caps, Erasmão estreou solo em 1965, com "A Pescaria".
Seus discos da fase jovem guarda são tímidos perto dos de Roberto (à parte o brilho roqueiro/ ingênuo de "Você Me Acende", de 66), mas de 68 em diante Erasmo, mesmo admitindo o susto diante do nascimento do tropicalismo, ficou endiabrado. E se tornou ídolo confesso de Jorge Ben, Gilberto Gil, Rita Lee.
Em "Erasmo Carlos" (68), apresentou Tim Maia antes de Elis Regina fazê-lo e tomar a fama; e deu um dos gritos de largada à soul music nacional, que cresceria frondosa nos anos seguintes.
Em 69, com "Erasmo Carlos e Os Tremendões", se alinhou à filosofia samba-rock de Jorge Ben e o Trio Mocotó, fincando clássicos como "Coqueiro Verde" e "Sentado à Beira do Caminho".
Em 71, lançou o petardo "Carlos, Erasmo...", cercado de gente de estirpe como Rogério Duprat, Caetano Veloso, Jorge Ben, integrantes dos Mutantes, o guitarrista Lanny Gordin e, claro, Roberto Carlos. Loucura: com tal elenco de músicos, nem assim fez tropicália -tinha personalidade, fez soul rock à carioca.
Depois, veio "Sonhos e Memórias" (72), sério candidato a álbum mais sereno do pop-rock nacional, com rockabilly, sambas funkeados e homenagens visuais a um elenco que ia de Carmen Miranda a James Dean, de Marilyn Monroe a Bob Dylan.
A saga continuou com muito rock'n'roll -"1990 - Projeto Salva Terra" (74), "Banda dos Contentes" (76), "Pelas Esquinas de Ipanema" (78), o genial disco de duetos "Erasmo Carlos Convida..." (80), com Gil, Jorge, Caetano, Nara, Rita, Gal e Bethânia.
Inaugurava aí sua fase pop, com faíscas ainda fortes em "Mulher (Sexo Frágil)" (81, todo para a mulher Narinha) e "Amar pra Viver, ou Morrer de Amor" (82).
Se quatro dos seis discos dos anos 60 foram relançados em CD pela RGE, todos os posteriores, da Philips, continuam confinados no desleixo da gravadora, hoje Universal (a mesma que faz coletâneas hediondas de dois artistas por volume, cheias de alhos mais bugalhos), a mesma que o deixou à míngua depois de 96.
Sem ter como conhecer melhor suas glórias passadas, a não ser por meio de vitrolas e sebos de discos, sobra a notícia da volta de sua alegria em compor. E só saber que ele se declara, aos quase 60, um roqueiro véio que chora diante do pirralho amarelo Bart Simpson já é motivo de sobra para desconfiar que ainda chove nessa plantação. Cuida bem desse coração, seu Erasmo. (PAS)


Texto Anterior: Música: Erasmo Carlos volta entre rock e country
Próximo Texto: Frases
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.