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CRÍTICA POESIA
A poesia de Adélia Prado soa conhecida em livro de inéditos
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Se humilde é um adjetivo
elogioso, o verbo humilhar-se é negativo. Não para Adélia Prado, em cuja poesia as
palavras têm a mesma origem: o húmus. Humilhar-se
é aproximar-se da terra e admitir que as palavras são feitas desse chão.
"Eu só quero saber do microcosmo", diz o poema "Tão
Bom Aqui", que abre seu último livro, "A Duração do
Dia". E é no e do microcosmo
que vêm os outros poemas,
dizendo que, mesmo no sofrimento, é "tão bom aqui".
É assim a poesia religiosa
de Adélia, para quem o pecado, o medo e o prazer são tão
sagrados quanto o espírito e
a panela de arroz.
Quando diz: "Sou um corpo e respiro./ Suspeito poder
viver/ com meio prato e
água", não se trata de apequenar-se diante de grandezas, mas de franqueza; o que
basta é só um pouco: as mulheres, "todas da vida, dão de
comer e comem/ coisas, de
si, agradecidas".
Como em Jorge de Lima, as
mulheres são "da vida" e
quem está mais próximo de
Deus é quem peca, os dementes e os que reconhecem
que pouco é mais belo do que
uma mãe dizendo à filha, antes de morrer: "vai calçar um
trem,/ agora mesmo a casa
enche de gente".
Nestes poemas em que a
eternidade discute pacificamente com o tempo histórico, a "graça", como bênção,
está intimamente ligada às
ideias de agradecimento,
graciosidade e humor.
Não é à toa que um ateu
como Drummond tenha se
espantado com essa poesia
crente e crédula, em que metáforas elaboradas se casam
com construções feitas de
"pequeninos nadas".
Não é poesia para religiosos; é poesia de palavras que
contêm e são contidas por
um cristianismo original,
que interessa também a
quem não crê.
Entretanto, após uma carreira de grande fôlego poético e narrativo, algo nesse novo livro soa conhecido.
A exigência de que sempre
se produza o novo é polêmica
e, mesmo assim, fica a vontade de que brotasse alguma
semente não conhecida.
Talvez, por meses, uma fé
menos teimosamente confessa, que se esgueirasse mais
sorrateira entre as palavras.
Mas é sempre bom que a
poesia de Adélia continue
nos afirmando que é muito
bom que "amanhã seja outro
dia,/ igual a este dia, igual,/
igual a este dia, igual".
A DURAÇÃO DO DIA
AUTOR Adélia Prado
EDITORA Record
QUANTO R$ 27,90 ( 112 págs.)
AVALIAÇÃO bom
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