São Paulo, Sábado, 21 de Agosto de 1999
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PRÊMIOS - CRÍTICA
Emissora e Brasil reconhecem perda de identidade

da Reportagem Local

Foi, provavelmente, a mais honesta de todas as edições do VMB. Tentando alegorizar os 500 anos do Brasil (ou os de Oscar Niemeyer, a julgar pelo número de vezes que seus edifícios apareceram nos telões), a MTV só comprovou que o Brasil se encontra, como ela própria, numa baita crise de identidade, homem seu menino...
A escolha da audiência determinou que as camadas de público que engrossaram Ibope antes minguado não estão engajadas na MTV e que os adolescentes fiéis que a amavam e amam continuam a gostar de rock'n'roll.
A MTV em si se acovardou, expurgando axé e pagode. O Art Popular fez funk e aeróbica; Ivete Sangalo arrepiou interpretando soul sem axé; sertanejos não deram as caras.
O corpo de jurados, de "formadores de opinião" e "socialites", foi em direção que não é nem a da audiência nem a do abrasileiramento lobista tipo "salve-se quem puder" por que passa a MTV.
Ignorou o Brasil andróide pós-axé. Não entendeu o espírito do pagode mauricinho e premiou Zeca Pagodinho. Deu chance a Otto de encarnar um Jorge Ben ano 2000, no adorável discurso de pedido de respeito aos mais velhos, às crianças e à MPB (que ele maculou, no entanto, louvando o mangue sem citar sua ex-banda, Mundo Livre S/A).
Sobretudo, reiterou-se a antipatia dos tais "formadores de opinião" pelo homem mais insistente do Brasil, Caetano Veloso. Sua supremacia, exponenciada pelo hit de chantagem emocional "Sozinho", sai arranhada, quando menos pela derrota para Chico Buarque -é tudo que Caetano menos suporta-, que, nobre que é, não se prestou ao circo.
Homem muito teimoso, Caetano comandou a nostalgia, jogando percussão de axé nos clássicos da tropicália (o apresentador Cazé, Chacrinha -inteligente- do século 21, buzinaria o show).
Caetano e um translúcido Gil secundaram Tom Zé, estrangeiro à própria pele, e Rita Lee, apaixonada pela tropicália em seu vestido medieval de Mutantes e nos seios postiços a lançar acidez contra si própria. Reduzido a Quarteto Tropicália, o glorioso movimento se auto-enterrou outra vez.
E qual é a cara do Brasil, enfim? Menos feia do que parecia (a estupenda montagem de samples a cada categoria foi o que mais de perto alegorizou o Brasil, eletrificando recortes de Mutantes, Nara Leão, jovem guarda, Baiano & Os Novos Caetanos, Jair Rodrigues, Gal cantando Jorge Ben...).
Querendo ou não, a MTV sem cara solapou o marketing bobo das 500 caras do monstro Brasil -ele está é sem cara nenhuma, e se admitir assim é dar um primeiro passo rumo à busca da identidade perdida. (PAS)


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