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"Fassbinder, hoje, surgiria no Brasil ou na Índia"
Ulli Lommel, que atuou em 14 filmes do diretor alemão, vem ao país para promover mostra do colega em SP e no Rio
Para o ator, momento atual do capitalismo deveria motivar artistas para a criação de movimentos de vanguarda
MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL
O ator e diretor alemão Ulli
Lommel não diferencia a arte
sofisticada da popular. Dramas
sociais, filmes de vanguarda ou
de terror são igualmente importantes, o que o fez trabalhar
com nomes tão díspares como
Andy Warhol e Russ Meyer.
Um dos principais colaboradores de Rainer Werner Fassbinder (1946-82), Lommel está
no Brasil para promover o ciclo
"Filmes Libertam a Cabeça: R.
W. Fassbinder", que começa
hoje no CCBB em São Paulo e
segue paralelamente até 1º/11
no Rio de Janeiro.
O ator, que acaba de lançar na
Alemanha um livro de memórias ("A Ternura dos Lobos"),
conta por que considera Fassbinder atual.
FOLHA - Fassbinder era o "enfant
terrible" do novo cinema alemão,
nos anos 60. Como o sr. vê hoje o trabalho dessa geração, que inclui nomes como Werner Herzog, Wim
Wenders e Alexander Kluge?
ULI LOMMEL - Ninguém criou
uma obra tão convincente e tão
relevante do ponto de vista político e social como Fassbinder.
Nosso grupo, na Munique dos
anos 60, era chamado de antiteatro, queria se afastar do entretenimento e usar o palco para mudanças políticas e sociais,
inspirado em Brecht. Outros
diretores não tinham esse tipo
de expressão. Acho que isso
torna Fassbinder e nosso grupo
relevantes até hoje, principalmente pelos temas centrais.
Primeiro, que o medo cria a
guerra e é utilizado pelos que
querem aumentar a opressão e
manipular as massas. Segundo,
queremos explorar os sentimentos no plano individual.
FOLHA - O sr. trabalhou com dois
dos principais artistas de vanguarda
desde os anos 60, Andy Warhol e
Fassbinder. Há espaço para essa ousadia atualmente?
LOMMEL - Sim, especialmente
agora. O ideal para artistas que
trabalham com novas experiências é ter um inimigo claramente identificado. Nessa época atual de capitalismo de cassino, em que os crocodilos de
água doce e salgada da globalização foram identificados, cada
artista, grupo de repertório e
movimento artístico poderia e
deveria formar movimentos de
vanguarda. Fassbinder diria
que precisamos abandonar o
fascínio pelo culto às celebridades, fugir da fama e da fortuna e
redescobrir o nosso potencial.
FOLHA - A obra de um artista como
Andy Warhol não tinha a ver com o
momento que Nova York vivia na
época? E Fassbinder?
LOMMEL - Uma força criativa
como Fassbinder, hoje, provavelmente surgiria em países
emergentes como Brasil ou Índia. Os velhos poderes estão
corrompidos e são incapazes de
liderar. China e Rússia são
exemplos trágicos, países que
passaram de uma forma excessiva de comunismo para um capitalismo brutal, que faz o Velho Oeste dos EUA parecer a
Disneylândia. Londres e Nova
York representam o eixo do poder abusivo anglo-saxão.
FOLHA - Como Klaus Kinski, o sr.
trabalhou em inúmeros filmes "B".
Por que essa atração por longas experimentais e populares?
LOMMEL - Com os chamados
filmes "B" é possível transmitir
mensagens que soariam óbvias
demais em um cinema de arte,
onde atingiriam um público
muito pequeno.
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