São Paulo, quarta-feira, 21 de outubro de 2009

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"Fassbinder, hoje, surgiria no Brasil ou na Índia"

Ulli Lommel, que atuou em 14 filmes do diretor alemão, vem ao país para promover mostra do colega em SP e no Rio

Para o ator, momento atual do capitalismo deveria motivar artistas para a criação de movimentos de vanguarda

MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL

O ator e diretor alemão Ulli Lommel não diferencia a arte sofisticada da popular. Dramas sociais, filmes de vanguarda ou de terror são igualmente importantes, o que o fez trabalhar com nomes tão díspares como Andy Warhol e Russ Meyer.
Um dos principais colaboradores de Rainer Werner Fassbinder (1946-82), Lommel está no Brasil para promover o ciclo "Filmes Libertam a Cabeça: R. W. Fassbinder", que começa hoje no CCBB em São Paulo e segue paralelamente até 1º/11 no Rio de Janeiro.
O ator, que acaba de lançar na Alemanha um livro de memórias ("A Ternura dos Lobos"), conta por que considera Fassbinder atual.

 

FOLHA - Fassbinder era o "enfant terrible" do novo cinema alemão, nos anos 60. Como o sr. vê hoje o trabalho dessa geração, que inclui nomes como Werner Herzog, Wim Wenders e Alexander Kluge?
ULI LOMMEL
- Ninguém criou uma obra tão convincente e tão relevante do ponto de vista político e social como Fassbinder. Nosso grupo, na Munique dos anos 60, era chamado de antiteatro, queria se afastar do entretenimento e usar o palco para mudanças políticas e sociais, inspirado em Brecht. Outros diretores não tinham esse tipo de expressão. Acho que isso torna Fassbinder e nosso grupo relevantes até hoje, principalmente pelos temas centrais. Primeiro, que o medo cria a guerra e é utilizado pelos que querem aumentar a opressão e manipular as massas. Segundo, queremos explorar os sentimentos no plano individual.

FOLHA - O sr. trabalhou com dois dos principais artistas de vanguarda desde os anos 60, Andy Warhol e Fassbinder. Há espaço para essa ousadia atualmente?
LOMMEL
- Sim, especialmente agora. O ideal para artistas que trabalham com novas experiências é ter um inimigo claramente identificado. Nessa época atual de capitalismo de cassino, em que os crocodilos de água doce e salgada da globalização foram identificados, cada artista, grupo de repertório e movimento artístico poderia e deveria formar movimentos de vanguarda. Fassbinder diria que precisamos abandonar o fascínio pelo culto às celebridades, fugir da fama e da fortuna e redescobrir o nosso potencial.

FOLHA - A obra de um artista como Andy Warhol não tinha a ver com o momento que Nova York vivia na época? E Fassbinder?
LOMMEL
- Uma força criativa como Fassbinder, hoje, provavelmente surgiria em países emergentes como Brasil ou Índia. Os velhos poderes estão corrompidos e são incapazes de liderar. China e Rússia são exemplos trágicos, países que passaram de uma forma excessiva de comunismo para um capitalismo brutal, que faz o Velho Oeste dos EUA parecer a Disneylândia. Londres e Nova York representam o eixo do poder abusivo anglo-saxão.

FOLHA - Como Klaus Kinski, o sr. trabalhou em inúmeros filmes "B". Por que essa atração por longas experimentais e populares?
LOMMEL
- Com os chamados filmes "B" é possível transmitir mensagens que soariam óbvias demais em um cinema de arte, onde atingiriam um público muito pequeno.


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