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Ele (a) - Ela (e)
Reprodução
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Billy (terceiro da esq. para dir.) e amigos posam com Duke Ellington (segundo a partir da esq.), em 54
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É lançada nos EUA a biografia do jazzista Billy Tipton, que por 50 anos manteve um segredo: era mulher
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ERIKA SALLUM
da Reportagem Local
William Tipton quase não acreditou no que ouviu do enfermeiro
encarregado de examinar o cadáver de seu pai: "Tem certeza de que
não é sua mãe?". Foi nessa manhã
de 1989 que ele descobriu o inacreditável: seu pai adotivo era mulher.
Resumindo: Billy -batizado(a)
Dorothy Lucille Tipton- era jazzista, casou quatro vezes, adotou
três crianças, e nem mulheres ou
filhos jamais desconfiaram que ele,
na verdade, era ela. Foram mais de
50 anos sustendo a mentira.
Após ser capa de jornais sensacionalistas, Tipton agora é tema de
um livro, "Suits Me: The Double
Life of Billy Tipton", de Diane
Wood Middlebrook, professora da
Universidade de Stanford. A obra
foi lançada recentemente nos EUA
e deve ser publicada em dezembro
no Reino Unido.
Recheada de fotos que mostram
passo a passo a transformação de
Dorothy em Billy, "Suits Me" traça
o perfil da garota do interior, nascida em 1914 em Spokane (Washington), que adorava jazz -um
meio essencialmente masculino
naquele tempo.
Com documentos, fotos e entrevistas, a autora tenta explicar por
que Dorothy, a partir dos 19 anos,
passou a se vestir de homem em
tempo integral. Principalmente à
noite, quando tocava, de terno e
gravata, em clubes locais.
"Suits Me" também se atém à vida particular de Billy, exposta em
longas entrevistas com as ex-mulheres do artista. "Eu cheguei até a
pensar que estava grávida de Billy
-isso mostra como eu era ignorante no assunto", afirmou Betty
Cox, segunda mulher do músico.
Para justificar por que não se
despia na frente de ninguém, Billy
dizia que um acidente havia deformado seu corpo, o que o obrigava a
andar com ataduras no peito.
Leia abaixo trechos da entrevista
que Diane Wood Middlebrook deu
à Folha há algumas semanas.
Folha - No livro, você defende a
tese de que Dorothy Tipton acabou se tornando Billy por causa do
jazz... Só por causa dele?
Diane Wood Middlebrook - Penso em Billy como um artista, uma
pessoa para quem o trabalho era a
principal atividade. Entreter o público era o mais importante para
ele. Todo o resto era criado para
sustentar isso. O que fez sua vida
valer a pena foi o mesmo que fez a
vida da poeta Anne Sexton (sobre
quem a escritora publicou uma
biografia) valer a pena: trabalhar
como artista no meio de artistas.
Folha - Quem teve a idéia de fazer um livro sobre a vida de Billy
Tipton foi sua última mulher, Kitty,
que acabou lhe propondo o convite. Por que você o aceitou?
Middlebrook - Biógrafos são,
provavelmente, voyeurs no sentido que Freud atribuía a todos os
intelectuais: são detentores de
uma produtiva posição de defesa
em relação ao mundo. O que mantém os biógrafos ativos é o desejo
de um conhecimento completo o
bastante para narrar uma vida.
Folha - Qual foi sua maior dificuldade para escrever o livro?
Middlebrook - Encontrar pessoas, muitas já bastante idosas. As
dificuldades desse projeto tinham
dimensões múltiplas, mas um dos
grandes aspectos foi o desafio para
mim como biógrafa: eu queria ver
se eu era ou não capaz de trabalhar
como uma jornalista investigativa,
mais do que uma acadêmica pesquisando em arquivos.
Folha - No livro, você descreve
uma série de piadas que Billy fazia
no palco e que insinuavam que havia algo de errado com sua masculinidade. Isso não era perigoso?
Middlebrook - Billy trabalhava
numa tradição de vaudeville, em
que esse tipo de brincadeira fazia
parte do entretenimento. Se você
pensar no Billy como, acima de tudo, um "entertainer", muitas coisas começam a fazer sentido.
Folha - Por que Billy Tipton não
revelou sua "verdadeira identidade" quando se mudou para Joplin,
uma cidade, segundo o livro, mais
aberta aos gays e lésbicas?
Middlebrook - "Aberta" possui
sentidos muito relativos. É preciso
considerar uma questão aqui: o
que, no fim das contas, Billy ganharia se assumindo? Na minha
opinião, não muita coisa.
Sobre o termo "verdadeira identidade", sempre penso em Billy como alguém que tinha desejos por
mulheres e que era capaz de satisfazer os desejos delas por meio de
um disfarce. Isso não o transforma
em uma lésbica no sentido que conhecemos hoje, para se referir a
uma identidade social focada na
preferência sexual.
Folha - Como foi entrevistar as
ex-mulheres de Billy e seus filhos?
Middlebrook - Acho que não seria profissional falar sobre pessoas
ainda vivas separadamente do que
eu escrevei sobre elas no meu livro.
Elas foram generosas comigo, é tudo o que posso dizer.
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