São Paulo, sexta, 22 de janeiro de 1999

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CRÍTICA
Detalhe que vale a pena

MARCELO OROZCO
do "Notícias Populares"

O inglês que chamou Dylan de Judas por usar guitarra está vivo e comprou "Bob Dylan Live 1966" porque seguiu sendo um fã após o impulso ofensivo.
Orgulhoso, ligou para o filho só para dizer: "Lançaram o disco do show em que eu xinguei Dylan!". Topou com a secretária eletrônica.
O filho, depois de ver um "Unplugged" de uma banda eletrificada tocando versões acústicas, foi se divertir numa rave. Sem preocupação de berrar "Judas!" caso um sample de violão seja acrescido à batida eletrônica.
E, pelo que se ouve no disco, nem a platéia dos shows ingleses deveria ter preocupação com instrumentos.
O CD 1 mostra que o "traidor" começava os shows sozinho, apenas com violão e gaita, do jeito folk que tinha começado. Canta saboreando cada sílaba, lembrando cada palavra das letras.
Talvez fosse esse encanto e a imagem de herói solitário que a platéia se recusava a perder na segunda parte, quando Dylan aparecia com o The Hawks.
Apupos, palmas lentas, e Dylan mais alegre e eufórico, empolgado pelo ritmo e pelo barulho. Simplesmente um bom show de rock, mas as hostilidades chegam e provocam o ápice com "Like a Rolling Stone".
Os acordes de guitarra são socados. Dylan põe veneno e ironia na voz, como dizendo que não faz diferença que instrumento toca. Fim de espetáculo.
Musicalmente, o conflito era injustificado. Porém, não fosse o amor e ódio entre platéia e Dylan, seria apenas mais um show que não valeria sair três décadas depois. É detalhe bobo que vale a pena no rock.



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