São Paulo, sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

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Última Moda

ALCINO LEITE NETO, em Milão - ultima.moda@folha.com.br

Milão em tempo de guerra

Disputa de editores americanos com estilistas italianos se acirra na temporada inverno-2008

Uma guerra de farpas entre editores americanos e estilistas italianos marcou o início do inverno-2008 da semana de moda de Milão, que começou no sábado e termina amanhã.
Estilistas importantes, como Giorgio Armani e Roberto Cavalli, se revoltaram contra a decisão da fashion week de concentrar os principais desfiles em poucos dias, como desejava a editora da "Vogue" americana, Anna Wintour, que alegou não dispor de tanto tempo e que Milão é uma cidade cara.
Nesta temporada, Armani decidiu não convidar a principal crítica do jornal "The New York Times", Cathy Horyn, para os seus desfiles, depois dos irônicos comentários que ela fez sobre a apresentação do estilista em Paris, em janeiro. Horyn chamou de "antiquada" a reação de Armani à sua crítica.
Mas foi Cavalli quem assumiu o posto de comandante no bombardeamento italiano. "A moda americana? Não vale nada. La Wintour? Não estou nem aí se ela não está na primeira fila do meu desfile: sejamos fortes. Se cortarmos a publicidade em sua revista, ela terá menos pressa em Milão", disse ele.
O mal-estar se agravou com uma reportagem da "Newsweek", apontando sinais de decadência política e socioeconômica na Itália. Segunda a revista americana, a "dolce vita" (doce vida) estaria dando lugar à "vita amara" (vida amarga).
A agitação feita pelos americanos é boa para que a moda italiana possa se repensar. Enquanto isso, Milão segue fazendo com pompa os seus rituais.
O principal deles é sempre o da Prada. Em seu salão enorme de desfiles, que parece um galpão industrial, Miuccia Prada mandou instalar desta vez uma rampa gigante em "s", por onde desciam e circulavam as modelos, permitindo que o público, sentado em pufes baixos, tivesse total visibilidade das roupas.
Era preciso ver tudo com muita atenção. A estilista mostrou uma coleção maravilhosa. O ponto forte foi o trabalho que ela realizou com rendas, trazendo este antigo produto para a nossa hipermodernidade.
Miuccia disse que sempre odiou rendas, mas acabou por reconhecer a importância delas para as mulheres -do batismo até o casamento e o luto. Perversa, contudo, a estilista mostrou as rendas elaboradíssimas em looks muito eróticos, que deixavam ver o corpo das modelos e desafiavam a tradição careta do produto.
O pensamento sobre o corpo feminino e o erotismo percorreu todo o desfile, seja na primeira parte, com formas arquitetônicas que pareciam guelras, membranas ou lábios gigantes abrindo-se em trajes mais austeros, seja nos detalhes masculinos e um tanto fetichistas de algumas peças, seja ainda nas roupas em tons "nude" (cor pele), que brincavam com os limites da silhueta e com a nudez.
O mais impressionante é que a inteligência da coleção se traduza em peças muito desejáveis por mulheres antenadas. Não foi à toa que algumas delas, entusiasmadas, não se contiveram e gritaram, como no final de uma ópera: "Bravo!".


com VIVIAN WHITEMAN

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