MARCOS CESANA
especial para a Folha


A rica biografia do escritor colombiano Gabriel García Márquez, "Viagem à Semente", parece uma das histórias imaginadas por ele.
Assim, ela não recorre apenas aos seus fatos cronológicos, mas faz uma investigação sobre pessoas, lugares e momentos, que contam, além da própria biografia de Márquez, outras tantas histórias do seu trabalho, dos seus amigos e do seu país.
Nascido na cidade de Aracataca (Colômbia), em 6 de março de 1927, e ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1982, García Márquez viveu e conviveu com as pessoas das histórias que criou. Nelas, há sempre o registro de alguém próximo à sua vida.
As experiências de Gabo - apelido pelo qual era chamado pela avó e pelos amigos- até os 8 anos de vida na casa dos avós, Nicolás Ricardo Márquez e Tranquilina Iguarán Cotes, são recorrentes em todo o resto da vida do escritor e em seu maior êxito literário: "Cem Anos de Solidão". Todas as passagens do avô sobre batalhas históricas dele, do general Uribe Uribe e de Simón Bolívar podem ser reconhecidas em seus livros. Isso acontece também com as histórias fantásticas contadas por sua avó, que conversava com os mortos e impressionava o pequeno Gabo.
Por isso, quando Dasso Saldívar escreveu a biografia de García Márquez, sabia do valor inestimável da casa de Aracataca. Tanto que recriou sua planta, por onde Gabo, seu avô, sua avó, suas tias e todos os personagens da família Buendía circularam.
A biografia revela-nos a formação do magro e tímido Gabito. Excelente em quase todos os cursos que fez. Leitor voraz e jornalista de grandes matérias investigativas. Toda a sua trajetória, apesar das dificuldades financeiras, foi excessivamente formada pela curiosidade que a literatura exerceu sobre ele.
Entre as obras que fizeram-no escritor, estão: "As Mil e Uma Noites", "Mrs. Dalloway", de Virginia Woolf , "Édipo Rei", de Sófocles, e, principalmente, "A Metamorfose", de Franz Kafka, que, quando acabou de ler, disse: ""Carajo!" Era assim que minha avó falava!" ( Hemingway e Faulkner também foram citados entre os seus preferidos).
Mas, talvez, a maior característica do romancista tenha sido, acima do talento, sua persistência. O autor de "O Outono do Patriarca", "Crônica de uma Morte Anunciada" e "Amor nos Tempos do Cólera" é marcado pela sua perseverança. Seu primeiro livro, "O Enterro do Diabo", demorou a ser concluído.
Quando o foi, chegou a ser recusado por uma editora, e o editor aconselhou-o a trabalhar em outra atividade.
Mas, enquanto se virava como jornalista, publicitário, roteirista e acumulava dívidas, ele escrevia e reescrevia os seus livros -um após o outro ou até dois ou três projetos, que iam nascendo concomitantemente.
Gabriel García Márquez sabia aonde queria chegar. Levou quase 20 anos entre a maturação e a escrita de "Cem Anos de Solidão" (seu primeiro grande sucesso), o mesmo tempo que o crítico literário Dasso Saldívar precisou para completar a biografia de GarcíaMárquez.
Tempo necessário também para plantar uma semente, a semente virar árvore e dar frutos.

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