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Hackers debatem
a representação
da realidade
LISETTE LAGNADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Eles criam fontes tipográficas e inventam alfabetos.
Eles enxergam o espaço por
meio de pontos, linhas. Eles esquadrinham as cidades horizontal e verticalmente. Eles alteram as distâncias, os ritmos,
as proporções. Eles comprimem e expandem ondas sonoras. Nada fixo, nem sequer uma
matriz. Pixel por pixel, eles dilatam a paisagem até as margens do monitor. Eles subvertem os objetivos bélicos do videogame. Eles têm o poder de
realinhar o mapa geopolítico
em um minuto. Chegaram os
hackers que atuam dentro da
legalidade da arte.
Angela Detanico e Rafael
Lain questionam os signos como sistema apto a representar
a realidade. Uma prática que
remonta à filosofia platonicista. E, no entanto, é como se cada novo trabalho dessa dupla
de artistas viesse dizer que há
muito ainda a ser dito sobre
linguagem, ciência e cidade. Se,
por um lado, o problema da representação permaneceu ao
longo da história, por outro, é
preciso reconhecer que o tempo modificou sua modulação.
Escrever em fonte "Utopia"
(2001) gera cruzamentos inéditos, porém virtualmente reais,
entre os projetos de Niemeyer e
o caos metropolitano: nem o
modernismo sucumbe às cercas e guaritas, nem essas excrescências ignoram seus alicerces. (...) O mundo é apresentado como um grande texto em
decifração permanente. (...)
Usando a tecnologia do digital e a indústria de entretenimento, Angela e Lain inserem a
instância da simulação entre as
tradicionais categorias de fenômeno e cópia. Em "Seoul/Killing Time" (2003), chamado
por eles de "vídeo de uma deserção", nossa expectativa de
assistir a cenas de combate foi
substituída por um vôo inofensivo sobre uma cidade-fantasma, traduzida depois em maquete. Desobedecer aos comandos está subitamente ao
alcance da mão; e se a multidão
soubesse dessa abertura acidental que o jogo proporciona?
E se "se..." existisse?
Texto elaborado para o catálogo da
26ª Bienal Internacional de São Paulo, a ser lançado em setembro
Lisette Lagnado é crítica de arte
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