SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"V alsa Nº 6" é talvez o texto mais desafiador de Nelson Rodrigues: o monólogo reúne os principais temas e técnicas do autor e exige que a atriz seja jovem, saiba tocar piano e dançar.
O fato do diretor Marco Antônio Braz escolher este difícil exercício para inaugurar o "projeto Nelson 90 anos" denota uma saudável fé no taco. Ele tem na manga não só um belo currículo de montagens de Nelson Rodrigues como uma atriz perfeita para o papel.
Rejane Arruda sabe impor todas as ambiguidades de Sonia, que é menina e mulher, morta e viva, cômica e trágica. Ora é enjoada como a Emília de Lobato, ora delirantemente sensual como as protagonistas de Lynch. Misturando memória e invenção diante da platéia, é uma personagem profundamente perturbadora.
Com um rodopio, trocando vozes e posturas, passa do velho doutor tarado para a mãe extremosa, para o "coro" das fofoqueiras, para a menina apavorada e, às vezes, deixa todas as personagens que rodopiam na sua mão caírem por terra e se dirige à platéia.
O cenário e o figurino buscam a síntese de todos os planos, o que a princípio é desarmante. Nelson previa apenas um piano branco diante de uma cortina vermelha, que não entregasse de início a chave do enigma. Telumi Helen avisa logo de que se trata. No entanto, o mistério revelado não mata o interesse da trama. É aí que entra Lynch: a trama alucinatória gira em si mesma no compasso de um surdo de samba estranhamente fúnebre.
O que deixa a desejar é justamente o excesso de técnica. Braz faz com que Rejane tire o fôlego da platéia com a sua agilidade, mas lhe dá raramente uma pausa para que aprofunde um depoimento pessoal. De todo modo, esta "Valsa Nº 6" acaba sendo excelente aquecimento técnico para o que ainda virá. E deixa sem dúvida uma grande vontade de se rever Rejane Arruda.

Valsa Nº 6    
Direção: Marco Antônio Braz
Com: Rejane Arruda
Onde: TBC (r. Major Diogo, 315, SP, tel. 0/xx/11/3115-4622); de qua. a sáb., às 21h; dom., às 19h
Quanto: R$ 16