|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Formato sofre com esgotamento precoce
ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA
Terminaria ontem a performance do "Urban Dream
Capsule", o grupo australiano que
passou 15 dias em exibição em
uma vitrine da avenida Paulista,
em São Paulo, como um museu
vivo, uma tela animada.
Em semana marcada pelo encerramento da segunda edição de
"Casa dos Artistas" e pelo início
da segunda versão do "Big Brother Brasil", a realização do grupo
de atores australianos reforça a
sensação de que o "reality show"
está por toda a parte.
A preocupação com a intervenção na vida cotidiana anima trabalhos em diversas áreas de manifestação artística, abarcando um
espectro amplo que perpassa a
"alta" e a "baixa" cultura. O artecidadezonaleste, a Bienal e exibições australianas são exemplos
recentes no campo das artes plásticas com contribuições que fazem eco aos "reality shows", cuja
carreira na TV brasileira, em ampla ascensão, parece ameaçada
por um esgotamento precoce.
"Casa dos Artistas 2" terminou
com pouco alarde no domingo,
prometendo voltar juntando os
dois lados da tela: fãs e artistas.
"BBB" voltou com efeito sonífero
acentuado, namoricos, futricas irrelevantes entre e sobre pessoas
que pouco interessam.
A novela, gênero "proto-interativo", herdeiro do folhetim do século 19 e precursor do "reality",
também concorre nessa faixa. Benito de Paula cantando na Bar da
Jura ou o discurso de salvação de
ex-drogados são exemplos de "janelas abertas para o mundo".
O experimento australiano
atraiu curiosos que se aglomeraram para se comunicar com
aqueles seres carecas de língua inglesa que procuravam macaquear
alguma graça do lado de lá da tela.
A movimentação estimulava o
lado de cá, onde pessoas tentavam
chamar a atenção dos estrangeiros com expressões corporais, coreografias baratas, qualquer gesto
que pudesse causar distinção. O
efeito gerado pela performance
pouco se diferencia do banal estimulado pelo "reality show".
A disseminação de formatos
que incorporam interlocuções diversas ao trabalho artístico gera
ao mesmo tempo uma sensação
de mesmice e o desafio de pensar
critérios que permitam traçar distinções significativas. Videoinstalações, fotomontagens, performances e "reality shows", que só
existem na medida em que inscrevem uma interlocução no próprio
corpo do trabalho, apresentam
graus diferentes de relevância.
Versões do desafio de reconhecer a relatividade e a efetividade
da representação, "reality shows"
poderiam emplacar se reconhecessem no interlocutor um ser inteligente, capaz de ir além da lição de moral da novela ou do exibicionismo dos jogos eliminatórios.
Texto Anterior: TV: "Casa 2" atesta a ressaca das segundas edições Próximo Texto: Panorâmica - Artes plásticas: Réplica de Rodin teria sido roubada do WTC Índice
|