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LITERATURA
"Crônicas do Brasil Contemporâneo" faz exame de época e propõe questionamentos por meio de lembranças
José Sarney remexe no tempo dentro do tempo
ANTONIO OLINTO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Depois de Proust, passamos a
entender que há sempre um
tempo dentro do tempo. Na sobreposição e confusão de um com
o outro, os diversos tempos retratam às vezes movimentos que
precisam ser analisados e avaliados, que é sina da raça humana
examinar tudo o que encontra pela frente, a fim de escolher, ou
não, o rumo necessário.
Coisas do tempo estão ligadas
ao "chronos", e é através da crônica, em geral escrita, por um partícipe de acontecimentos que atingem seus contemporâneos, que
fixamos problemas e achamos soluções.
O título dos dois volumes de novos escritos de José Sarney
-"Crônicas do Brasil Contemporâneo"- assume o compromisso de estudar o tempo que é
dele e nosso, escrevendo. Porque
sabemos que o autor não se apresenta apenas como um político
profissional que escreve: ele é, na
realidade, um escritor que também faz política.
Seu romance "O Dono do Mar"
é uma obra de ficção que fala por
nós e nos revela como povo e como a nação. Vivia eu na Europa
nos anos 80, quando tive convites
de uma editora inglesa e outra alemã para escrever prefácios para
volumes de contos de Sarney que
saíam naqueles idiomas. O tradutor alemão Curt Meyer-Clason
disse-me então de sua alegria ao
ler esses contos e surpreender, no
estilo de Sarney, belas palavras luso-brasileiras que desconhecia.
Nos dois volumes publicados
aprofunda-se José Sarney no exame de nosso tempo, visto do Brasil e dos vários ângulos que a diversidade brasileira permite.
Lembrando sua atitude -a única
de um governador de então (Sarney governava o Maranhão na
época)- contra o Ato Institucional nš 5, leva o leitor a uma visão
do Brasil registrada em estilo de
absoluta contenção e firme rijeza.
Pelas crônicas de agora, acompanhamos o tempo dentro do
tempo, que Sarney revela, não só
em acontecimentos, com cenas
que possamos ter conhecido na
época, mas colhendo também a
verdade intrínseca de cada trecho
de nossa vida nacional e de nossa
posição no contexto de uma contemporaneidade que nos situa no
mundo.
O que houve no Brasil e fora dele entre 1998 e 2002 está registrado
neste levantamento de Sarney que
-jornalista e escritor- lembra
Odylo Costa Filho, o pintor Floriano Teixeira, Carybé, Manuel
Bandeira, fala de Jorge Amado em
seus últimos tempos de vida,
pronto para entregar seu tempo
ao futuro. Dos conselhos que dá,
cita Sarney o de Baudelaire que
nos ensinou: "Temos de ser absolutamente modernos".
No meio de suas lembranças,
propõe questionamentos antes de
cada crônica, dá notícias do momento, numa espécie de prestação de contas ao Tempo, que está
sempre ao lado, esperando.
Em suma, "Crônicas do Brasil
Contemporâneo", de José Sarney,
junta dois volumes de A Girafa
que merecem leitura e meditação.
Antonio Olinto é crítico literário e
membro da ABL
CRÔNICAS DO BRASIL
CONTEMPORÂNEO. Autor: José Sarney.
Editora: A Girafa. Quanto: R$ 50 cada
volume (vol. 1 com 366 págs. e vol. 2
com 336 págs.)
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