São Paulo, sexta, 22 de maio de 1998

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ARTES PLÁSTICAS
Acervo pode voltar a crescer, diz Marques

da Reportagem Local

Ex-curador-chefe do Masp e coordenador-geral do catálogo do museu, o professor Luiz Marques falou à Folha sobre as surpresas que encontrou no acervo, sobre suas lacunas (escola caravaggesca internacional e barroco setentrional italiano) e sobre a necessidade de que o acervo volte a crescer.
(CELSO FIORAVANTE)

Folha - Você teve alguma surpresa durante a confecção do catálogo?
Luiz Marques -
Se você pega a parte de pintura da Europa do Norte, existem obras que nunca foram expostas ou apenas raríssimas vezes. O museu tem um desenho magnífico do Henry Moore, uma série raríssima de 11 gravuras do Max Beckmann, três nanquins de Otto Ritschel, dois desenhos do Kokoschka. O acervo sobre papel do Masp é muito importante.
O museu tem ainda uma coleção expressiva do pop inglês, com obras de Peter Blake, Joe Tilson e William Scott. Isso, talvez, devido ao fato de o Chateaubriand ter sido embaixador na Inglaterra e ter deixado um sucessor que trabalhou para a doação de obras ao museu naquela época.
Folha - Quais são as grandes ausências do acervo do Masp?
Marques -
O museu não tem nenhum quadro da pintura borromaica italiana, o barroco do norte da Itália não está representado, e é uma das pinturas mais importantes da história. O museu tem um quadro do Ciro Ferri, um do ateliê de Guido Reni.
Você encontra apenas um quadro do Bartolomeo Passante, que é o único caravaggesco do museu. Não é possível dizer que a pintura caravaggesca, que é um grande movimento internacional, que dominou 20 ou 30 dos mais fecundos anos da pintura européia, esteja representada. Não tem um caravaggesco espanhol ou romano.
Não estou querendo um Caravaggio, mas o livro que o Nicholson escreveu sobre o caravaggismo tem quatro volumes e apenas de fotografias.
O Masp não tem pintura francesa do século 17. Tem um Poussin, magnífico, mas é o único. Tem um quadro do Clouet, mas as três gerações de Fontainebleau não estão representadas. Não tem pintores ingleses do século 16 e 17. As lacunas são gigantescas.
Folha - Como o acervo poderia voltar a crescer e de uma maneira consequente?
Marques -
Não existe nenhuma dificuldade. Basta que a sociedade queira. Se houver um entendimento do museu nesse sentido e se a sociedade entender, isso acontece. A sociedade investe naquilo que ela quer, em Beto Carrero ou em museu.
Se você quiser fazer um museu extremamente importante em termos de acervo, o mercado está aí para oferecer, inclusive a preços muito baratos. O que falta não é quadro, mas vontade de comprar.
Folha - O crescimento do acervo ainda é necessário ou é mais importante o trabalho de divulgação e conservação?
Marques -
Eu diria que não existe uma hierarquia. Mas posso afirmar que voltar a crescer não é menos importante.
Conservar pode ser melhor que crescer, mas uma coleção que não cresce, morre. Um museu que não cresce não está levando adiante o projeto que o justifica.
O Julio Neves, presidente do Masp, está fazendo um trabalho que deve ser feito, senão o prédio cai. Tudo isso com certeza custa muito dinheiro, mas também é preciso voltar a crescer.
Folha - A doação indiscriminada ajuda ou atrapalha o museu?
Marques -
O museu não deveria aceitar tudo, mas propor a doação de obras. Se ele quer comprar algo, faz uma campanha. Você doa R$ 50, eu dôo R$ 50 e a Companhia Antarctica Paulista doa R$ 50 milhões e o museu compra o quadro.
As campanhas não devem se limitar a financiar reformas no museu, mas a comprar obras também. O Emanoel Araujo já tomou a dianteira na Pinacoteca e comprou um Maillol, dois Rodin e deve comprar um Bourdelle.
Não adianta fazer uma exposição magnífica do Kiefer e não ficar com nenhuma obra dele no acervo.
Mas esse tipo de iniciativa acabará sendo tomada pois é o exemplo internacional que acabaremos seguindo também.



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