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Multipremiado em festivais, longa estréia hoje no circuito comercial de 11 cidades do país, com 50 cópias
O 'Bicho' testa seu fôlego
Baseado em uma história real, filme de Laís Bodanzky fala de tratamento manicomial, uso de drogas e família
Divulgação
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Os atores Gero Camilo, Rodrigo Santoro e Caco Cioler (da esq. para a dir.), em cena de "Bicho de Sete Cabeças", que estréia hoje |
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Um cigarro de maconha flagrado pelo pai custou ao estudante
Neto (Rodrigo Santoro) a internação em um hospital psiquiátrico, anos de medicação controlada
e sessões de eletrochoque.
Baseado no relato testemunhal
"Canto dos Malditos" (editora
Rocco), "Bicho de Sete Cabeças" é
o longa de estréia da diretora Laís
Bodanzky, 31, que tem cinema no
currículo por herança (é filha do
cineasta Jorge Bodanzky) e conquista -dirigiu "Cartão Vermelho", entre outros seis curtas e vídeos. Com o marido, Luiz Bolognesi, roteirista de "Bicho", Bodanzky empreendeu o projeto de
exibições públicas e gratuitas Cine Mambembe, em praças do
país. Filme para o público é a divisa da cineasta, que realizou o seu
primeiro título com R$ 1,5 milhão
e foco no espectador adolescente.
Folha - Qual dos temas abordados em "Bicho de Sete Cabeças"-
tratamento manicomial, relações
familiares, intolerância, incomunicabilidade- mais lhe interessa?
Que história queria contar?
Laís Bodanzky - Vejo no filme
dois temas centrais: a questão manicomial no Brasil hoje e a dificuldade de diálogo em família. Eu
participava de um grupo de pesquisa sobre a questão manicomial
para a produção do documentário "Loucura e Cidadania", de Roberto d'Avila. Descobri como era
preconceituosa com o tema, a caricatura que tinha do universo da
loucura. Fiquei decepcionada comigo mesma e emocionada com
essa realidade. No meio da pesquisa, chegou às minhas mãos o
livro "Canto dos Malditos", de
Austregésilo Carrano Bueno. Esse
foi o arremate. O livro é um desabafo. Escutei-o e tive certeza de
que tinha de contar essa história,
de fazer com que muitas pessoas
soubessem desse grito para que a
história não se repetisse. Hoje
existem 70 mil internos em hospitais manicomiais no Brasil. É um
número desproporcional. Não faz
sentido essa quantidade de leitos,
essa política de internação.
Folha - Supõe-se que as internações ocorram por distúrbios mentais existentes. No caso abordado
em "Bicho", não havia doença.
Bodanzky - Sem dúvida. Foi um
erro médico. Mas, assim como esse erro ocorreu com Carrano, ele
se repete hoje em diversas facetas.
Esse é um dos grandes perigos do
mundo da psiquiatria, que é um
mundo abstrato, com um discurso poderoso, que a gente não tem
como criticar ou fiscalizar. Quando o sofrimento mental justifica
uma internação? O movimento
antimanicomial não é contra a internação, mas defende que ela
ocorra apenas em caso de crise. É
claro que isso dá mais trabalho.
Folha - A captação de recursos para a produção estendeu-se por quase três anos. Que aspecto do roteiro
afugentava os investidores?
Bodanzky - Acho que a questão
manicomial foi sempre o que incomodou mais. O filme não levanta tanto a questão da droga.
Embora ela provoque a virada, seja o grande absurdo que coloca a
posição radical da família e modifica a vida desse adolescente, não
nos detivemos sobre isso, porque
não era nossa questão central.
Folha - A escolha de Rodrigo Santoro para interpretar o protagonista foi sua primeira opção?
Bodanzky - Nunca pensei em outra pessoa. Dois anos antes das filmagens, Paulo Autran leu o roteiro e me perguntou se eu já tinha o
ator protagonista. Eu ainda não
pensava a respeito, e ele me indicou Rodrigo Santoro, com quem
havia trabalhado na minissérie
"Hilda Furacão". Disse que era
um excelente profissional, muito
concentrado e com o perfil do
personagem. Eu nem sabia direito
quem era Rodrigo e fui assistir a
"Hilda Furacão". Aí me "caiu a ficha", tinha de ser ele.
Folha - Com 16 prêmios conquistados em festivais, o filme aponta
para uma carreira de público amplo, embora seja voltado para adolescentes. A intenção era fazer um
filme para o público juvenil?
Bodanzky - Desde o início. Com
a experiência do Cine Mambembe [projeto de exibições cinematográficas em praças públicas", eu
e o roteirista Luiz Bolognesi percebemos o quanto é importante a
empatia do público com a história
e com o personagem central. Como nosso protagonista era um
adolescente, definimos que o filme seria para adolescentes.
Folha - Cineastas sempre lamentam a impossibilidade de corrigir
falhas perpetuadas em seus filmes.
Qual o defeito que você observa em
"Bicho de Sete Cabeças"?
Bodanzky - Colocamos o roteiro
e a montagem para serem criticados por adolescentes. A partir dos
comentários, algumas cenas saíram e outras foram incluídas.
Quando você mostra um filme
em que acredita para ser criticado, é uma crise. Há o impacto; você o absorve e muda. Passei por isso. Não sei dizer quantas vezes vi
o "Bicho". A-do-ro esse filme. Estou lambendo a cria. Gosto de cada detalhe. Sou incapaz de citar
um defeito. Não consigo.
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