São Paulo, sexta-feira, 22 de junho de 2001

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MÚSICA


Cantor radicado em Alagoas desde os oito anos lança seu primeiro disco e faz show em São Paulo no dia 29

Wado chega advogando a arte da periferia

DA REPORTAGEM LOCAL

Em 1996, o pernambucano Fred Zero Quatro declamava com seu Mundo Livre S/A: "Não espere nada do centro/ se a periferia está morta/ pois o que era velho no norte/ se torna novo no sul". Esse parece ser o ponto de partida do quase alagoano Wado para se lançar agora com um disco de estréia que se chama "O Manifesto da Arte Periférica".
Wado tem 23 anos e é quase alagoano, porque nasceu em Santa Catarina, embora viva desde os oito anos na Alagoas de Djavan, dos Collor, da petista Heloísa Helena e, mais recentemente, de uma cena pop de artistas muito jovens, liderados (se tanto) por nomes como Wado e a dupla Sonic Júnior.
"É um Estado pobre, com índices ruins de analfabetismo. Mas não acredito que seja tão diferente do país inteiro", diz o moço por telefone, do Rio, descrevendo a periferia que o motiva a criar e a já abrir o CD com versos como "você bem sabe em que ponta/ a corda sempre arrebenta".
Responde sobre a existência de uma possível cena em Maceió, como houve de seis anos para cá em Recife, com o mangue beat de Fred Zero Quatro e Chico Science:
"O nível está muito bom, Sonic Júnior e Mopho já apareceram em São Paulo e Rio. Acho que as pessoas em Alagoas só não se ligaram ainda como cena por falta de auto-estima. Estamos tentando nos juntar como um grupo mesmo".
Recém-formado jornalista, Wado já enfrenta o paradoxo de ter de fugir do norte para se fazer notar no sul: "Com certeza ficarei no Rio até o final do mês. Se não conseguir "trampo", volto para Maceió. O ideal seria ficar lá, mas isso não é a realidade".
Não estaria entrando em contradição com o título do disco? "É uma pena ter que descer, mas é aqui que as coisas acontecem. A gente não existe, estou existindo só a partir de agora. É triste ver tanta gente boa que não existe. O conceito do CD é que se crie e produza arte na periferia, como fiz. Como [o antropólogo" Hermano Vianna falou, a periferia não é um lugar. Há um Buena Vista Social Club em cada morro do Rio."
Wado fala, enfim, da tradução sonora de seus preceitos: "O ponto forte são as timbragens. Misturamos timbragens antigas, dos anos 60 e 70, o Jorge Ben antigo com um pouquinho de ruído do atual. A gente passeava pelo rock, mas ele foi substituído pelo samba e pela música brasileira. Escuto Secos & Molhados, Novos Baianos, Banda Black Rio".
Não vê em tal prática reprocessadora -nem no manifesto pela arte periférica- um parentesco inexorável com o mangue beat.
"Não acho que seja filiado ao mangue beat, na minha opinião não tem nada a ver. A mistura sempre foi da música brasileira. O mangue é um conceito fechado, no meu nem existe um manifesto como houve o do mangue beat. Meu manifesto é o disco", afirma Wado. Tropicalismo, então? "Tem, sim, não tenho vergonha de dizer."
Sua arte periférica chega ao centro da periferia -São Paulo- ao vivo, pela primeira vez, na próxima sexta, quando Wado se apresenta no festival London Burning, no Orbital (r. Augusta, 2.894, tel. 0/xx/11/5096-0737).
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


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