São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 2000

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DANÇA
"Salt", coreografia de Édouard Lock, é apresentada de hoje a domingo pela companhia canadense no teatro Alfa
La La La Human Steps acelera passo em SP

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Sob um feixe de luz branca, que ofusca o olhar, surge uma bailarina em sapatilhas de pontas. Do palco imerso em sombra, aos poucos vão surgindo outros parceiros, que no decorrer do espetáculo sempre acabam confluindo para a dança a dois. A partir de tal estrutura se desenvolve a dança veloz e complexa de "Salt", novo sucesso do grupo canadense La La La Human Steps, que estréia hoje, no teatro Alfa.
Concebido pelo coreógrafo mais aclamado da dança contemporânea canadense, Édouard Lock, que fundou o La La La em Montreal, no início dos anos 80, "Salt" procura desafiar a percepção e a concentração do público, por meio de imagens que parecem se diluir sob o impacto da rapidez. Para tanto, os bailarinos valem-se de grande virtuosismo, pois a ordem também é não deixar a velocidade interferir na precisão dos movimentos.
Pela primeira vez, as bailarinas do La La La usam sapatilhas de pontas e associam desenvoltura atlética à técnica do balé clássico. Segundo Lock, tais recursos contribuem para intensificar os efeitos da velocidade, gerar tensão e, por fim, produzir no espectador a sensação de que não será possível reter na memória tudo o que suas retinas estão captando.
No título "Salt" (Sal), Lock reafirma sua proposta. Além de sugerir resíduo ou as sobras que o mar deixa na areia, o nome do espetáculo ainda contém o duplo sentido da substância capaz de purificar os alimentos, mas também se converter em droga. Sob o signo da dubiedade, "Salt" transcorre num ambiente em preto-e-branco, e sua música ao vivo contrasta os sons distorcidos de uma guitarra elétrica e as harmonias de um piano e de um violoncelo.
Para completar, as danças de casais são predominantes na coreografia de "Salt". "Há uma complementaridade de forças na dança a dois e o casal é um signo universal", diz Lock. "Salt" ainda inclui em sua cenografia uma sucessão de imagens virtuais, filmadas pelo próprio coreógrafo. Projetadas em telas arredondadas, contrapõem a vitalidade de um bebê a expressões maliciosas de adultos.
Lock diz que não há um tema específico em "Salt", que estreou em 98 no Japão, com o objetivo de dar a volta ao mundo até 2001. "Contudo uma profunda tristeza emana do espetáculo", diz. Desde "2", sua coreografia anterior, Lock sintonizou suas metáforas com a passagem do tempo e a urgência perante a finitude da vida.
Brilhante na concretização cênica de conceitos, Lock também atua como cineasta e fotógrafo. "Palavras são insuficientes para expressar a percepção do mundo. Imagens costumam ser mais eficazes e, quando nascemos, é por meio do corpo que emitimos e recebemos informações."
Ao transpor tais pensamentos para o palco, Lock procura estimular novas dimensões para o olhar. "Geralmente, o que costumamos ver são pequenas porções de um corpo majoritariamente invisível, feito de células, órgãos internos, emoções e alma. Ao colocar em cena corpos em movimento muito rápido, procuro fazer com que a sensação de velocidade e complexidade abra portas para outra percepção, capaz de nos levar além do que não conseguimos enxergar."
Com elenco renovado, o La La La está de volta ao Brasil depois de participar, oito anos atrás, do extinto Carlton Dance Festival.


Espetáculo: Salt, de Édouard Lock, com o grupo La La La Human Steps Quando: hoje e amanhã, às 21h; domingo, às 18h Onde: teatro Alfa (r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel. 0/xx/11/0800-558191) Quanto: R$ 20 a R$ 90 Patrocinadores: IBM, Embratel e Ministério da Cultura


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