São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 2000

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Primeira instalação da artista de 86 anos é exposta no Paço das Artes, em São Paulo
Tomie Ohtake equilibra o desequilíbrio com ferro

Ricardo Ohtake
Instalação da pintora, escultora, e gravurista Tomie Ohtake, formada por 12 aros móveis, que estará em exibição no Paço das Artes, em São Paulo, a partir do dia 28



Obra tem 12 aros de cerca de 4 metros de diâmetro, com formas ondulares que chegam a 1,5 metro de altura


FERNANDA CIRENZA
DA REPORTAGEM LOCAL

A dois meses de completar 87 anos, Tomie Ohtake se prepara para mostrar em São Paulo e no Rio de Janeiro a sua primeira instalação.
Pintora, escultora, gravurista e uma das principais criadoras de obras públicas no Brasil, Tomie (que detesta ser chamada de senhora) disse que precisava fazer "uma coisa" diferente.
O novo projeto, exposto a partir do dia 28 no Paço das Artes, em São Paulo, tem 12 aros circulares de ferro pintado, de cerca de 4 metros de diâmetro, com formas diferentes e ondulares que chegam a 1,5 m de altura.
Dispostos próximos uns dos outros, com espaço para caminhar entre eles, os aros fazem um movimento pendular quando tocados, agindo sobre o imaginário do espectador.
Paulo Herkenhoff, último curador da Bienal de São Paulo e hoje no MoMa de Nova York, escreve no texto do catálogo que "o espaço é um campo de instabilidade em busca de repouso, talvez como o mar agitado de Hokusai, ou como a turbulência discreta das pinceladas curvas da pintura atual de Tomie".
Para a artista, a idéia é leveza. "As pessoas movimentam os aros, entende? São pequenas sensações", afirmou ela, com um português atrapalhadíssimo, apesar de viver no Brasil há 64 anos.
"Erro meu. Sou uma preguiçosa", justificou, sem permitir, com gentileza, que a conversa fosse gravada. "É horrível."
Os grandes círculos são deformados de propósito. "Não são bem-feitos, mas têm de ser suaves", explicou Tomie.
A obra inédita vai ficar exposta no Paço até 5 de novembro. Depois segue para o MAM (Museu de Arte Moderna) do Rio, onde ficará instalada de 13 de novembro a 21 de janeiro de 2001. Lá, a instalação estará em um espaço aberto, no piso térreo do museu.
"Tomara que vente bastante para a obra se movimentar também com a ajuda do vento", torce.
No mesmo período da mostra no MAM, deve ocorrer a exposição retrospectiva das pinturas de Tomie -ao todo, 65 obras- no Centro Cultural Banco do Brasil.
Ela, que começou a pintar no Japão, interrompeu sua trajetória nas artes plásticas logo após a sua chegada ao Brasil, em 1936. No ano seguinte, casou com Ushio ("Alberto em português") e passou a cuidar da família.
"Os meninos (Ruy, 62, arquiteto, e Ricardo, 57, arquiteto, designer gráfico e secretário do Verde e do Meio Ambiente) foram criados com rigor. Às vezes, dava uns tapas. Pensava primeiro na família, entende?", perguntou, preocupadíssima com o seu jeito particular de falar o português.
Quando Ricardo completou dez anos, em 1952, Tomie voltou a ter aulas de pintura com um grupo de pessoas em um ateliê improvisado em sua casa na Mooca.
"Coloquei os móveis da sala de jantar na de visitas, e ali a gente estudava com um professor japonês. Mas ele não ensinava nada, ficava só lendo livros. Depois, dava uns palpites."
O Ushio não estranhou essa mudança dentro de casa? "Nada. Casei com ele porque era bom e bonito. Ele me apoiava, dizendo que os meninos cresceriam sozinhos." Não foi o que aconteceu.
Mesmo em franca atividade, Tomie ficou de olho nos meninos. "Minha mãe era assim, rigorosa. Ela me ensinou muitas coisas."
No reinício de seu curso pelas artes plásticas, Tomie criou pinturas figurativas, mas pouco a pouco simplificou o traço e se tornou uma das maiores representantes do abstracionismo informal, ao lado de Manabu Mabe.
O uso da cor, especialmente vermelho e amarelo, é característico de sua pintura. "Gosto delas. São existenciais", afirmou.
Com uma vitalidade de dar inveja aos mais jovens, Tomie partiu para a criação de esculturas recentemente, em 1995 -as obras públicas não estão consideradas.
Foi nesse ano, na 23ª Bienal de São Paulo, que ela apresentou uma série de esculturas brancas.
Para criar as esculturas e a instalação, Tomie "brinca" com arames. "Não desenho. Pego arame e trabalho com as mãos."
Suas esculturas, sempre de grandes dimensões, parecem querem desafiar a lei da gravidade. "Gosto de equilibrar o desequilíbrio", disse.
Para dar o efeito esperado, ela conta com o apoio do engenheiro Aluísio Fontana Margarido, que faz os cálculos dos projetos da artista, e do casal de arquitetos Vera e Jorge Utsonomiya. "Somos uma equipe, entende?"
Tomie, que mantém o difícil espírito de menina disciplinada e travessa, ao mesmo tempo, disse não gostar de farras. "Adoro sair, ir ao cinema, a exposições e encontrar os amigos." E arremata: "Importante é ser feliz".


Exposição: Tomie Ohtake Quando: de 28 (abertura) a 5 de novembro Onde: Paço das Artes (av. da Universidade, 1, Cidade Universitária, São Paulo, tel. 0/xx/11/211-0682) Horários: de 2ª a 6ª, das 13h às 20h. Sábado e domingo, das 14h às 19h


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