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José Resende faz humor pop em nova individual
Artista lembra obra de Brancusi em esculturas de sabonetes em bronze e resina
Em "Acasalamentos", escultor adota processo artesanal pela primeira vez, nas obras mais figurativas de sua trajetória artística
SILAS MARTÍ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Brancusi está tomando banho na mais nova individual de
José Resende, aberta hoje pela
galeria Marília Razuk. O escultor paulistano afirma que viu
no célebre "Beijo" do artista romeno a inspiração para esculturas de um objeto com uma
conexão menos óbvia com o
amor: sabonetes.
Na obra de 1916, Constantin
Brancusi (1876-1957) transforma um bloco de pedra em dois
amantes que se beijam: o mesmo material parece se juntar e
se separar ao mesmo tempo.
Em "Acasalamentos" -que
reúne os trabalhos mais figurativos de sua trajetória- Resende troca a tradicional justaposição de elementos díspares que
marcou suas esculturas e adota,
pela primeira vez, um processo
artesanal para forjar, do bronze, a imagem de dois sabonetes,
grudados um no outro.
São 25 deles em tamanho
real, 14 ampliados para um tamanho maior -alguns em fibra
e resina-, além de seis placas
de resina suspensas do teto
-feitas do material usado em
aparelhos odontológicos. Nebulizadores com luzes coloridas umidificam o ambiente e
dão a impressão de levar a mostra para debaixo do chuveiro.
"É a idéia de trazer o humor e
certo erotismo à flor do olho,
não à flor da pele, porque a pele
já está acostumada com a sensação", brinca. "Há certo humor, certa leveza em pensar em
Brancusi tomando banho."
Povera pop
Resende sempre foi identificado com a pesquisa de materiais e a apropriação de elementos cotidianos às obras de arte,
motes da arte povera -movimento italiano dos anos 1970.
A mostra atual causa certo
espanto. Quem conhece seus
trabalhos com tubos de cobre,
chumbo, cabos de aço e chapas
de ferro -a escultura "Jardim
Jacques Tati" (1970) e uma
obra sem título da mesma fase
podem ser vistas em mostra do
Instituto Tomie Ohtake- deve
estranhar o impacto reduzido
dos novos trabalhos, que ocupam apenas o primeiro piso da
galeria. A nova técnica empregada é outro fator surpresa.
"Esses processos são mais
lentos. Eu costumo ter ações
mais imediatas com meus trabalhos, com gestos mais rápidos", diz o artista, que, em obra
de 2001, mandou erguer vagões
de trem com cabos de aço.
De tradicional na obra de Resende nesta mostra, só as placas penduradas do teto, feitas
de maneira mais imediata: um
cabo de aço confere a estrutura
adquirida pela resina, enquanto tubos de cobre, usados no
encanamento doméstico, servem de suporte.
Se o artista toma distância de
trabalhos anteriores, não descarta conexões com a pop art,
ao deslocar a imagem do sabonete para a galeria, numa operação que lembra também Magritte. Ex-integrante do grupo
Rex, breve experimento iconoclasta brasileiro dos anos 1960,
Resende diz assumir aqui essa
herança pop, numa espécie de
banho irreverente.
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