São Paulo, terça, 22 de setembro de 1998

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Bechara devora tempo e espaço

JUDITH MORAES
free-lance para a Folha

Devorar o tempo e o espaço. Essa é a intenção do mais recente trabalho de José Bechara, cuja exposição começa nesta quinta-feira, no MAM (Museu de Arte Moderna) do Rio. Com a idéia de fazer uma intervenção pictórica no amplo espaço do salão monumental do MAM, que tem oito metros de pé direito e mil metros quadrados, Bechara passou 11 meses trabalhando em um galpão de uma fábrica abandonada em São Cristóvão, na zona norte do Rio.
A série principal se chama "Comendo Margaridas" e é formada por cinco telas gigantes de aproximadamente quatro metros de comprimento por cinco metros de largura. As peças foram confeccionadas a partir de lonas de caminhão e ferrugem e têm como missão interagir com a imensidão da sala onde estarão expostas.
"É um volume de ar muito grande, eu tento engolir o ar. É um desafio, já que a intervenção no espaço real não é diretamente ligada à tradição da experiência pictórica", explica o artista.
A pintura numa escala superdimensionada e feita com materiais não tradicionais, como lona e ferrugem, leva José Bechara a questionar se ele ainda se consideraria um pintor. "Sou um pintor que tenta esgarçar a sua própria experiência pictórica", responde.
A especificidade do projeto levou Bechara, que possui um ateliê em Santa Tereza, na região central do Rio, ao galpão industrial da zona norte. Segundo o artista, o novo local de trabalho o inspirou a pensar em temas como tempo, memória, sobra, resto, abandono e isolamento. Ele explica:
"A fábrica ocupa três quarteirões num lugar onde a cidade sobrou. O sistema econômico rejeitou aquela massa falida, onde convivi com vira-latas e mendigos, comunidade rejeitada pelo entorno. Essa atmosfera potencializou minhas motivações para o trabalho."
O título da série, "Comendo margaridas", remete à ação do tempo, ingrediente imprescindível na confecção da obra. Bechara utilizou palha de aço molhada, que, deixada em contato com a lona, produzia ferrugem com a passagem do tempo. A idéia de Bechara é, com o resultado da deterioração do tecido rústico, falar de corrosão, finitude e explorar a ação do tempo. "O trabalho é um fenômeno que depende do tempo", afirma.
Ainda estarão presentes na mostra 12 telas de Bechara que estiveram expostas em São Paulo, nas galerias Thomas Cohn e Marília Razuk, até o último dia 11.
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Exposição: José Bechara
Onde: MAM-Rio (av. Infante Dom Henrique, 85, Rio, tel. 021/210-2188)
Quando: de 25/09 a 22/11 (de ter. a dom., das 12h às 18h)
Quanto: R$ 3 e R$ 1,50 (estudantes e maiores de 65 anos)




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