São Paulo, terça, 22 de setembro de 1998

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"O Auto de Leidiana" leva Rosemberg Cariry à sátira

da enviada a Salvador

"O Auto de Leidiana", filme inédito de média-metragem do diretor cearense Rosemberg Cariry, abriu a 25ª Jornada Internacional de Cinema da Bahia.
O filme, uma comédia paródica, representa uma vertente nova na obra de um diretor tematicamente filiado ao projeto do cinema novo, em que o Nordeste seco e as injustiças sociais predominam.
Tendo visitado a Jornada do ano passado para apresentar seu longa mais recente, "Corisco e Dadá", Cariry conheceu o casal de atores Nelson Xavier e Via Negromonte e, mais tarde, achou que eles se adequariam ao tom satírico de seu novo filme.
O texto fora escrito por Mapurunga Filho em redondilhas (versos de sete sílabas), ao estilo dos cordelistas nordestinos e inspirado no teatro que Gil Vicente desenvolveu em Portugal durante o século 16.
O título do filme, no entanto, é uma referência ao mesmo tempo humorística e terna às 60 mil meninas que, entre 1996 e 1997, foram batizadas de Leidiana no Ceará, em homenagem à princesa inglesa Diana.
Num Ceará cheio de flores e cores das montanhas de Guaramiranga, inteiramente avesso às tradicionais imagens desoladoras da seca, desenvolve-se essa versão cordelesca de "Dona Flor e Seus Dois Maridos".
Leidiana despreza o marido e volta sua atenção a um beato. Ameaçado, o marido invoca o diabo, interpretado por ninguém menos que José Mojica Marins, o lendário Zé do Caixão. Leidiana, porém, supera todos em esperteza e assim derrota o orgulho machista à sua volta.
Em entrevista à Folha, Nelson Xavier, consagrado no cinema brasileiro desde seu trabalho em "Os Fuzis", de Ruy Guerra, e Via Negromonte, atriz, cantora e bailarina -e jurada da 25ª Jornada-, contaram de sua experiência com Cariry. (LN)


Folha - Como foi a experiência de fazer "O Auto de Leidiana"?
Via Negromonte -
Rimos muito, adoramos fazer. Foi um relacionamento festivo e amistoso, iniciado com Cariry durante a Jornada de 97. Depois, quando José Maria de Mapurunga Filho ganhou um prêmio com o roteiro de "O Auto de Leidiana", Cariry resolveu filmá-lo e nos convidou.
Nelson Xavier - Fomos ao Ceará e fizemos tudo em uma semana.
Negromonte - As filmagens duraram apenas três dias, e gastamos os outros viajando, porque as montanhas de Guaramiranga ficam longe de Fortaleza. É como uma Petrópolis cearense. Apesar de todo o verde, o lugar é absolutamente nordestino.
Folha - O filme vai um pouco contra a idéia de que a cultura popular é uma cultura do sofrimento.
Xavier -
Acho isso muito bom, vital à beça.
Negromonte - Para você ter uma idéia, o set não era cenário. Aquele colorido maravilhoso parece produzido, mas não é. A casinha da Leidiana não foi nem pintada: ela era realmente rosa e verde-jade. A grama era realmente aquele tapete verde.
Xavier - Não foi nada maquiado.
Folha - Como foi contracenar com José Mojica Marins? Vocês já o conheciam antes?
Xavier -
Não com essa intimidade. Ele é uma pessoa inacreditável. A pessoa dele é seu próprio personagem. Ele acorda e dorme impostado.
Negromonte - Dei uma de jornalista e perguntei a ele de onde havia surgido aquela inspiração de ser vampiro. Ele me disse que aos seis anos teve um sonho que nunca mais o abandonou. Parece coisa de menino travesso com medo. A mim, durante a filmagem, ele passou a sensação de ser mesmo um menino desprotegido. Por isso, ele é um vampiro cômico, um vampiro de desenho animado.



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