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CINE ÍRIS
Espaço vira salão de festas no fim-de-semana
Cinema pornô resiste bravamente
CRISTINA GRILLO
da Sucursal do Rio
Outubro de 1909. Mulheres
com vestidos de gala, jóias e chapéus chegam acompanhadas por
homens de fraque e cartola para
assistir a uma sessão de "Lili Borboleta". A fita havia sido "expressamente confeccionada para
esta casa e interpretada por distintos amadores", como dizia o
texto do convite para a inauguração do Cinema Theatro Íris, na
rua da Carioca, centro do Rio.
Outubro de 1999. Os 90 anos
do cinema serão comemorados
amanhã com mais uma festa
Loud! -a mais badalada entre
os "modernos" cariocas, que
costuma reunir perto de mil pessoas a cada edições.
Mas a festa só começa a ser
montada depois que o último fiel
frequentador das sessões de filmes pornôs, exibidas incessantemente a partir das 10h, sair do cinema -o que, aos sábados,
acontece às 20h.
"Não me interessa mudar o estilo do cinema. Tenho público
fiel para as sessões. Deixo o pessoal fazer as festas quando o cinema não está funcionando", diz
Roberto Cruz, 45, diretor do Íris
e bisneto do fundador da sala,
João Cruz Júnior.
O Íris é um dos raros cinemas
pornôs sobreviventes no Rio.
Seus frequentadores são homens
de classe média baixa que circulam pelo centro da cidade, homossexuais e algumas poucas
garotas de programa.
Muitos dos cinemas pornôs da
cidade foram comprados por
igrejas evangélicas e viraram
templos. O Íris resistiu por empenho da família Cruz.
"Já tivemos propostas de alguns bispos, mas a família quer
continuar com o negócio. Tivemos que partir para o pornô nos
anos 80, para acompanhar os outros cinemas da área. Agora ficamos quase sozinhos e não queremos perder o público", diz uma
das netas do fundador, Nylza
Cruz de Rezende, 71.
O aluguel do espaço para "festas modernas", como diz Nylza,
foi a opção encontrada pela família para continuar preservando o cinema. "É bom para o Íris
ter essa mudança de público, interessado na preservação do espaço. Além disso, são mais recursos para a manutenção do cinema", diz Roberto Cruz.
A frequência diária média é de
500 pessoas, que pagam R$ 4 para assistir a sessões duplas de filmes e shows de striptease, às 15h
e às 18h. Para as festas, que começaram a acontecer do início
do ano, Cruz aluga o cinema.
O reforço no caixa será usado
para as obras de reforma do prédio. O Íris é um dos melhores
exemplos de arquitetura art nouveau no Rio, mas suas paredes
estão sujas, os espelhos de cristal
precisam ser recuperados, e as
ferragens das escadarias pedem
um polimento.
Nylza conta que o avô, um milionário filho de portugueses, decidiu fazer no Rio "o mais belo
cinematógrafo" do país. Trouxe
azulejos em alto-revelo de Portugal, escadarias, grades e outras
ferragens da França, usou madeiras nobres como peroba e canela nos revestimentos internos
e contratou Paulo de Frontin,
um dos mais famosos engenheiros da época, para cuidar da
construção.
"Nosso cinema não foi o primeiro do Rio, mas sem dúvida
foi o mais luxuoso da época e o
primeiro a exibir filmes falados,
no final dos anos 20", diz a neta
do fundador.
Na década seguinte, o empresário Francisco Serrador começou a construção na vizinhança
do que ficou conhecido como
Cinelândia -vários cinemas gigantescos e modernos, que acabaram roubando boa parte do
público do Íris.
O prédio do Íris foi tombado
pelo Patrimônio Histórico em
1983. Desde então, não pode sofrer modificações.
Roberto Cruz está fazendo um
levantamento das cores originais
do cinema e procurando especialistas para reparar os azulejos
portugueses -alguns rachados-, as escadarias francesas e
toda a estrutura do prédio.
A família vai cuidar da obra sozinha. "Estamos fazendo o orçamento e vamos bancar tudo, como sempre. Todo mundo fala
que isto aqui é lindo, mas só nós
cuidamos. Sempre foi assim",
afirma Roberto Cruz.
O bisneto do fundador nem
pensa em recorrer a empresas
que, por meio de leis de benefício
cultural, como a Rouanet, poderiam ajudar na reforma do Íris.
"Prefiro fazer sozinho. Depois
vão querer mudar nosso cinema,
transformar em centro cultural,
e isso nós não queremos", diz.
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