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POLÍTICA CULTURAL
Projetos terão de comprovar chances de estréia e sucesso para receber dinheiro de incentivo fiscal
Tribunal barra uso de verba pública em filmes "invisíveis"
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Daqui para a frente, somente se
demonstrarem chances reais de
estrear nos cinemas e atrair platéias os filmes brasileiros poderão
ser feitos com dinheiro público.
A decisão foi tomada anteontem pelo Tribunal de Contas da
União (TCU ), como resultado de
auditoria na Agência Nacional do
Cinema (Ancine). A agência é
quem avalia os orçamentos e autoriza os projetos de longas-metragens brasileiros a usar em sua
produção dinheiro que empresas
pagariam de Imposto de Renda.
O mecanismo, conhecido como
renúncia fiscal -o governo abre
mão de receber o imposto, em favor da realização de projetos culturais- é regulamentado pelas
leis Rouanet e do Audiovisual.
Quase 100% dos filmes feitos no
Brasil utilizam esse incentivo.
Prejuízo
Ao auditar a Ancine, o TCU verificou que, no universo de filmes
analisados, mais de 30% foram
concluídos (com o uso de R$ 12
milhões de incentivo fiscal), mas
nunca estrearam. "Isso representa prejuízo aos cofres públicos,
uma vez que são recursos que deixam de entrar no Tesouro, para financiar filmes que não são exibidos e, conseqüentemente, não
trazem benefícios para a sociedade", conclui a auditoria, relatada
pelo ministro do Tribunal Augusto Sherman Cavalcanti.
Com o fim de evitar que filmes
sem chance de encontrar um lugar no mercado (por razões como
"baixa qualidade" ou pela "falta
de perspectiva comercial", conforme cita a auditoria) continuem
recebendo incentivos do governo,
o TCU determinou que a Ancine
passe a realizar "análises de viabilidade técnica e comercial dos
projetos", antes de aprová-los.
O procedimento adotado hoje
pela agência, de acordo com constatação do TCU, se resume à conferência de documentos que comprovem idoneidade da empresa
autora do projeto. "Observadas
essas exigências, qualquer proposta, independentemente de sua
qualidade ou viabilidade, pode
ser aprovada", afirma o relatório.
"Dirigismo cultural"
O diretor-presidente da Ancine,
Gustavo Dahl, diz que "como é
determinação do Tribunal de
Contas, a agência vai ter de aplicar
esses critérios. Até que ponto isso
poderá ser considerado o polêmico tema do "dirigismo cultural" só
a experiência poderá dizer".
Outra conclusão do TCU é que a
Ancine autoriza sistematicamente, "sem amparo legal", a cobrança de "taxa de administração" pela qual os produtores do projeto
recebem até 10% do valor total.
Em 2003, foi de R$ 80 milhões,
segundo o TCU, a captação de recursos por meio das leis de incentivo para a realização de longas-metragens. Quase R$ 8 milhões
desse total se destinaram à "taxa
de administração". A inconveniência dessa taxa, aponta o Tribunal, é que ela não tem aplicação
direta na realização do projeto,
mas sim no custeio de despesas fixas de seus produtores.
O Tribunal diz que "no caso do
audiovisual, as leis de incentivo
têm por finalidade o financiamento de projetos" e que "é inconcebível que o sacrifício feito
pelo Estado, decorrente da renúncia de parte de sua receita, tenha
por objetivo manter a atividade
do setor cinematográfico".
A decisão do TCU nesse aspecto
foi a de determinar à Ancine que
revogue "os dispositivos que
atualmente permitem a inclusão
de taxa de administração nos orçamentos dos projetos".
O diretor da agência afirma que
"só resta à Ancine acatar o entendimento do TCU", mas diz que a
agência "aumentou de 5% para
10% a taxa de administração, a pedido da [área de] produção". Segundo Dahl, os produtores consideram a taxa de administração
equivalente "às comissões cobradas pelas produtoras de publicidade ou pelas empreiteiras".
O TCU determinou também
que a Ancine "se estruture adequadamente" para fiscalizar os
projetos, evitando contratação de
auditorias externas pelas empresas produtoras. Esse tipo de contratação é hoje uma prática. A auditoria identificou sua "concentração" numa empresa. "De todos
os processos analisados, só um
não utilizou a referida empresa."
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