São Paulo, sábado, 22 de outubro de 2005

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29ª MOSTRA DE CINEMA

Diretor português nonagenário exibe a partir de hoje seu novo filme, lança livro com debate e acompanha sua retrospectiva

Oliveira exibe todas as faces de seu cinema

COLUNISTA DA FOLHA

O cinema de Manoel de Oliveira, quando não o cineasta em pessoa, tem sido uma presença constante na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo desde a exibição de "Amor de Perdição", na edição de 1979. Mas desta vez o cineasta português de 96 anos, o maior de seu país e um dos mais prestigiados do mundo, estará por aqui em dose tripla.
Em carne e osso, Oliveira, que deve chegar hoje a São Paulo, será homenageado por sua carreira de mais de sete décadas. Além disso, a Mostra programou uma retrospectiva completa de seus filmes, incluindo o mais recente, "Espelho Mágico" (leia crítica ao lado).
Por fim, a editora Cosacnaify, em parceria com a organização do evento, lança amanhã, a partir das 18h, o alentado e luxuoso volume "Manoel de Oliveira", organizado por Alvaro Machado mais ou menos nos mesmos moldes dos livros dedicados nos anos anteriores ao israelense Amos Gitai e ao iraniano Abbas Kiarostami.
A retrospectiva dará aos cinéfilos a oportunidade de conhecer preciosidades do diretor, como o documentário poético "Douro, Faina Fluvial" (1931), seu primeiro filme, e o drama "Aniki-Bóbó" (1942), protagonizado por crianças e considerado precursor do neo-realismo.
Os admiradores do cinema de Oliveira poderão ver ou rever desde suas adaptações literárias clássicas, como "Amor de Perdição" (1978) e "O Sapato de Cetim" (1985), até as obras da fase "internacional" mais recente, como "O Convento" (1995), "Viagem ao Princípio do Mundo" (1997), "A Carta" (99) e "Um Filme Falado" (2003), passando pelos históricos "Non, ou a Vã Glória de Mandar" (1990), "Palavra e Utopia" (2000) e "O Quinto Império" (2004), sem falar das insólitas alegorias "Os Canibais" (1988) e "A Divina Comédia" (1991).

Balanço da carreira
Essa obra múltipla e essencial, que ganhou um notável impulso nos anos 80 graças à associação do cineasta com o produtor Paulo Branco (de quem Oliveira se afastou a partir deste novo filme), é passada em revista e discutida detidamente no livro "Manoel de Oliveira".
Uma longa entrevista do diretor ao crítico Leon Cakoff, fundador e diretor da Mostra de São Paulo, é acompanhada, no volume, por alentados ensaios assinados pela crítica literária Leyla Perrone-Moisés e pelos críticos de cinema Inácio Araujo, da Folha, e João Bénard da Costa, um dos mais respeitados de Portugal.
Completam o volume três artigos e um "poema cinematográfico" do próprio Manoel de Oliveira, além de uma filmografia completa, organizada pelo jornalista Orlando Margarido.
Na entrevista a Leon Cakoff, Oliveira explicita sua concepção da imagem cinematográfica como um "fantasma" do real e realça o papel cultural e civilizatório do cinema. Refuta certos avanços tecnológicos como facilitadores da produção de obras que não têm o que dizer.


Atravessa toda a entrevista uma profunda preocupação espiritual. A todo momento o cineasta se despe de qualquer vaidade, dizendo que um dos maiores erros do homem contemporâneo é ter a pretensão de rivalizar com "o Criador" (palavra recorrente no discurso de Oliveira).
Entre os textos assinados pelo diretor, talvez o mais interessante seja "Os Caminhos da Prostituição", em que ele contrapõe a vida boêmia de sua época à dos tempos atuais, traçando um gracioso e ao mesmo tempo preciso relato sobre as transformações morais e de costumes.
Em outro artigo, intitulado "Rios da Terra, Rios da Nossa Aldeia", Oliveira discorre sobre um de seus temas mais caros, o rio Douro, que corta "sua aldeia", a cidade do Porto.
Curiosamente, um dos mais recentes filmes do diretor, o semidocumental e semi-autobiográfico "Porto da Minha Infância" (2001), é um retorno ao rio e à terra natal do autor de "Douro, Faina Fluvial", realizado 70 anos antes. Que outro cineasta no mundo ostenta tamanha longevidade, vigor e coerência?
(JOSÉ GERALDO COUTO)

Lançamento do livro "Manoel de Oliveira"
Autor:
Alvaro Machado (org.),
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 69,90 (240 págs.)
Quando: amanhã, às 18h, haverá debate e sessão de autógrafos no Clube da Mostra, no Conjunto Nacional (av. Paulista, 2.073, São Paulo)


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