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29ª MOSTRA DE CINEMA
Diretor português nonagenário exibe a partir de hoje seu novo filme, lança livro com debate e acompanha sua retrospectiva
Oliveira exibe todas as faces de seu cinema
COLUNISTA DA FOLHA
O cinema de Manoel de Oliveira, quando não o cineasta em pessoa, tem sido uma presença constante na Mostra Internacional de
Cinema de São Paulo desde a exibição de "Amor de Perdição", na
edição de 1979. Mas desta vez o cineasta português de 96 anos, o
maior de seu país e um dos mais
prestigiados do mundo, estará
por aqui em dose tripla.
Em carne e osso, Oliveira, que
deve chegar hoje a São Paulo, será
homenageado por sua carreira de
mais de sete décadas. Além disso,
a Mostra programou uma retrospectiva completa de seus filmes,
incluindo o mais recente, "Espelho Mágico" (leia crítica ao lado).
Por fim, a editora Cosacnaify,
em parceria com a organização
do evento, lança amanhã, a partir
das 18h, o alentado e luxuoso volume "Manoel de Oliveira", organizado por Alvaro Machado mais
ou menos nos mesmos moldes
dos livros dedicados nos anos anteriores ao israelense Amos Gitai
e ao iraniano Abbas Kiarostami.
A retrospectiva dará aos cinéfilos a oportunidade de conhecer
preciosidades do diretor, como o
documentário poético "Douro,
Faina Fluvial" (1931), seu primeiro filme, e o drama "Aniki-Bóbó"
(1942), protagonizado por crianças e considerado precursor do
neo-realismo.
Os admiradores do cinema de
Oliveira poderão ver ou rever desde suas adaptações literárias clássicas, como "Amor de Perdição"
(1978) e "O Sapato de Cetim"
(1985), até as obras da fase "internacional" mais recente, como "O
Convento" (1995), "Viagem ao
Princípio do Mundo" (1997), "A
Carta" (99) e "Um Filme Falado"
(2003), passando pelos históricos
"Non, ou a Vã Glória de Mandar"
(1990), "Palavra e Utopia" (2000)
e "O Quinto Império" (2004), sem
falar das insólitas alegorias "Os
Canibais" (1988) e "A Divina Comédia" (1991).
Balanço da carreira
Essa obra múltipla e essencial,
que ganhou um notável impulso
nos anos 80 graças à associação
do cineasta com o produtor Paulo
Branco (de quem Oliveira se afastou a partir deste novo filme), é
passada em revista e discutida detidamente no livro "Manoel de
Oliveira".
Uma longa entrevista do diretor
ao crítico Leon Cakoff, fundador e
diretor da Mostra de São Paulo, é
acompanhada, no volume, por
alentados ensaios assinados pela
crítica literária Leyla Perrone-Moisés e pelos críticos de cinema
Inácio Araujo, da Folha, e João
Bénard da Costa, um dos mais
respeitados de Portugal.
Completam o volume três artigos e um "poema cinematográfico" do próprio Manoel de Oliveira, além de uma filmografia completa, organizada pelo jornalista
Orlando Margarido.
Na entrevista a Leon Cakoff,
Oliveira explicita sua concepção
da imagem cinematográfica como um "fantasma" do real e realça o papel cultural e civilizatório
do cinema. Refuta certos avanços
tecnológicos como facilitadores
da produção de obras que não
têm o que dizer.
Fé
Atravessa toda a entrevista uma
profunda preocupação espiritual.
A todo momento o cineasta se
despe de qualquer vaidade, dizendo que um dos maiores erros do
homem contemporâneo é ter a
pretensão de rivalizar com "o
Criador" (palavra recorrente no
discurso de Oliveira).
Entre os textos assinados pelo
diretor, talvez o mais interessante
seja "Os Caminhos da Prostituição", em que ele contrapõe a vida
boêmia de sua época à dos tempos atuais, traçando um gracioso
e ao mesmo tempo preciso relato
sobre as transformações morais e
de costumes.
Em outro artigo, intitulado
"Rios da Terra, Rios da Nossa Aldeia", Oliveira discorre sobre um
de seus temas mais caros, o rio
Douro, que corta "sua aldeia", a
cidade do Porto.
Curiosamente, um dos mais recentes filmes do diretor, o semidocumental e semi-autobiográfico "Porto da Minha Infância"
(2001), é um retorno ao rio e à terra natal do autor de "Douro, Faina
Fluvial", realizado 70 anos antes.
Que outro cineasta no mundo ostenta tamanha longevidade, vigor
e coerência?
(JOSÉ GERALDO COUTO)
Lançamento do livro "Manoel de Oliveira"
Autor: Alvaro Machado (org.),
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 69,90 (240 págs.)
Quando: amanhã, às 18h, haverá debate
e sessão de autógrafos no Clube da
Mostra, no Conjunto Nacional (av.
Paulista, 2.073, São Paulo)
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