São Paulo, sábado, 22 de novembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TRECHO

"Do outro lado da rua, o Paraíso das Damas acendia extensas fileiras de lampiões a gás. E ela se aproximou da porta, novamente atraída pela rua [...] Através dos vidros empalidecidos por um bafo quente, notava-se um pulular vago de claridades, todo um interior confuso de usina. As vitrines pareciam naufragar; distinguia-se apenas, logo defronte, a neve das rendas, cuja brancura era avivada pelos vidros brilhantemente iluminados por uma fila de lampiões. E, naquela pretensa capela, as confecções avultavam-se em vigor, o grande mantô de veludo, ornado de uma pele prateada de raposa, levava o perfil de uma mulher sem cabeça, que parecia correr sob a chuva para alguma festa, para as sombras desconhecidas de Paris.
Cedendo à sedução, Denise chegara até a porta, sem se preocupar com os respingos de chuva que a molhavam. A essa hora da noite, com seu brilho de fornalha, O Paraíso das Damas acabava de capturá-la por inteiro. Na grande cidade, negra e muda sob a chuva, nessa Paris que ela ignorava, ele incendiava como um farol, parecendo irradiar toda a luz e a vida do bairro. Ela sonhava seu futuro ali, com muito trabalho para educar as crianças, mas também muitas outras coisas.
Ela não sabia bem o quê, entrevia apenas coisas longínquas, cujo desejo e o temor faziam-na estremecer.
A idéia daquela mulher morta nas fundações voltou-lhe; ela sentiu medo, imaginou ver todas aquelas luzes sangrarem; então a brancura das rendas a acalmou, uma esperança subia-lhe ao coração, toda uma certeza de felicidade. Enquanto isso, a névoa de água volante esfriava-lhe as mãos e acalmava sua febre"
Extraído de "O Paraíso das Damas", de Émile Zola


Texto Anterior: Crítica/ "O Paraíso das Damas": Émile Zola encena o mundo do consumo e do supérfluo
Próximo Texto: Vitrine
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.