São Paulo, Quarta-feira, 22 de Dezembro de 1999


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RÉPLICA
Fui engolido pelos monstros

JÚLIO MEDAGLIA
especial para a Folha

A propósito da reportagem "Medaglia é demitido da Amazonas Filarmônica", publicada pela Ilustrada em 17 de dezembro último, tenho esclarecimentos a fazer.
No momento em que o governador Amazonino Mendes me incumbiu de formar uma orquestra para o teatro Amazonas, a primeira reação que tive foi a seguinte: para que essa orquestra tenha qualidade e seja imune às intempéries e interesses políticos, deverá ser estruturada como uma "organização social". Portanto, fora da emperrada máquina pública.
A dotação orçamentária deve ser aprovada por lei, assim não poderá ser extinta com uma penada por um futuro governante.
Diferentemente do meu desejo e o do próprio governador, ela foi implantada na Secretaria de Cultura. A partir do momento em que comecei a solicitar essa independência, parcialmente conseguida, fui submetido a um processo de tortura, comparável somente ao de meu "irmão" Claudio Santoro em Brasília.
O dele acabou com a sua morte. O meu, com minha expulsão do Amazonas. Inúmeros textos de "empresa de utilidade pública" chegaram a ser feitos e dois até registrados. Todos, porém, sempre ligados à Secretaria.
O texto que criava a estrutura social está assinado pelo governador. Mas as pressões daqueles que viam na Filarmônica um objeto de manobra política e pessoal, com poderes na cidade, foram tão grandes que o governador Amazonino voltou atrás.
Como nunca ninguém disse nada contra a qualidade da orquestra, contra meu trabalho, contra a proposta como um todo; como a Filarmônica era só brilho, elogios, apoio popular e dos críticos, até mesmo fora de Manaus; como o clima de trabalho com os músicos era sereno e de alta produtividade; como o próprio governador se referia à orquestra como "a pérola" de seu governo, a fórmula encontrada por meus detratores foi a de fazer acusações pessoais as mais sem sentido, promovendo uma demissão que não foi sequer fruto de uma deliberação do conselho administrativo.
Arbitrária, portanto. As manifestações contrárias à minha demissão chegaram às centenas. A tática do avestruz e da intimidação, porém, foi a utilizada por aqueles que jamais souberam como se faz cultura, alguns empoleirados no poder público, outros dependentes dele.
Os monstros que quis afastar do processo artístico me engoliram antes. Coisas da vida...


O maestro Júlio Medaglia, 61, é ex-regente da Amazonas Filarmônica


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