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Elena Poniatowska homenageia cientistas em "La Piel del Cielo'; romance será seu primeiro título no Brasil, em 2002
FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Hélène Elizabeth Louise Amélie
Paula Dolores Poniatowska
Amor. O nome de princesa não é
à toa. Filha de um descendente da
família real polonesa, Jean Poniatowski, e da mexicana Dolores
Amor, Elena Poniatowska, 69, estava destinada a se casar com algum príncipe europeu. Preferiu
ser jornalista e escritora.
Polonesa de origem, francesa de
nascimento e mexicana por adoção (vive no país materno desde
1942), a menina curiosa que perguntava "e depois?" quando a
mãe acabava as histórias com "e
viveram felizes para sempre" tornou-se a primeira mulher no México a ganhar o Prêmio Nacional
de Jornalismo, em 78, e colheu
também vários louros literários.
O mais recente foi o Prêmio Alfaguara de Romance 2001, por "La
Piel del Cielo" -seu primeiro título a atrair uma editora brasileira, a Objetiva, que o lança no segundo semestre de 2002.
Concorrendo sob o pseudônimo de "Dumbo", Poniatowska
surpreendeu o júri do prêmio dado pela editora homônima espanhola, que acreditava ser um homem o autor da história de Lorenzo de Tena -filho bastardo de
um aristocrata decaído com uma
camponesa, cuja sabedoria intuitiva sobre a natureza o inspira a
mirar o céu e perscrutar estrelas.
Imaginavam menos ainda que
se tratasse de uma autora que se
voltara tantas vezes a personagens femininas, como a fotógrafa
italiana Tina Modotti ("Tinissima", biografia romanceada que
lhe custou dez anos de trabalho
deu o Prêmio Mazatlán em 92) ou
um septeto de ilustres mexicanas,
entre elas Frida Kahlo, em "Las
Siete Cabritas" (2000).
A experiência de jornalista, em
que diz ter sempre preferido o homem comum aos políticos, permeia sua literatura.
A mescla pode dar no incensado
"La Noche de Tlatelolco" (71)
-vozes reais sobre o massacre de
estudantes que protestavam, em
68, na Plaza de las Tres Culturas,
na Cidade do México- ou no novo "La Piel del Cielo", em que astrônomos de verdade cruzam as
páginas de mãos dadas com personagens inventados.
"Quis dar a muitos dos cientistas seus nomes verdadeiros para
render-lhes homenagem; porque
ninguém fala deles, quis que aparecessem no meu livro", disse Poniatowska à Folha, em entrevista
concedida na 15ª Feira do Livro de
Guadalajara, no mês passado.
Folha - Por que escrever um livro
sobre um astrônomo?
Elena Poniatowska - Sempre tive
um grande interesse pela ciência.
Eu sou jornalista desde 1953 e
sempre vi que se dá importância
enorme aos escritores e intelectuais, mas nunca aos cientistas.
Além disso, achei importante
saber o que significa a ciência em
um país de Terceiro Mundo. No
México, com a fronteira com os
EUA, pensamos que importando
a tecnologia de lá se resolvem nossos problemas. No entanto, os
mexicanos, por tradição, foram
grandes astrônomos, são muito
criativos. Por isso achei que era
um tema importante. Claro, fiz
também uma história de amor.
Folha - Lorenzo de Tena quer ajudar as pessoas, mas lida mal com
elas; é um misantropo, que não se
encaixa em seu meio e prefere as
estrelas. Comente, por favor.
Poniatowska - Ele é intolerante,
crítico, pensa que todo mundo é
estúpido. Nós também pensamos
coisas do gênero, mas não dizemos. Se nos abrissem a cabeça,
como uma noz, e vissem tudo o
que pensamos, diriam "que barbaridade". Lorenzo, não, ele fala
tudo o que pensa. Por isso briga,
tem inimigos, parece antipático.
Folha - "La Piel del Cielo" cobre
um período longo da história do
México. Herança do jornalismo?
Poniatowska - Começo nos anos
20, 30 e termino em tempos quase
da cibernética, de propósito.
Abarco cerca de 80 anos. Acho
que toda literatura, à exceção da
ficção científica, é reflexo da realidade do autor. Em geral, são muito poucos os autores que ficam de
fora de seus livros.
Folha - Qual aspecto de sua realidade se reflete no romance, então?
Poniatowska - Fui casada com
um grande astrônomo mexicano
[Guillermo Haro, 1913-1988".
Quando vivi com ele, meus filhos
eram muito pequenos, não participei da vida científica, mas serviu
para eu dizer "gostaria de fazer esse romance". Porém é uma ficção.
Folha - Ser jornalista ajudou-a a
pesquisar e compor os personagens e descrever fatos científicos?
Poniatowska - Ao longo do tempo, fiz muitas entrevistas com
cientistas, comprei muitos livros
de ciência -obviamente não li
todos, não tive tempo. Tenho um
quarto na minha casa cheia de livros e entrevistas sobre ciência.
Folha - Como o fato de ser jornalista influencia sua narrativa?
Poniatowska - Você se acostuma
a escrever, não espera a inspiração. Passa a acreditar que existem
dias bons e dias maus, dias em
que o que você escreve e o que sai
não parece tão horrível e dias em
que tem que jogar fora o que escreveu. Ajuda a adquirir o ofício e
isso não tem preço. Mas fiz jornalismo demais. Entrevistei muita
gente, louvei muitos escritores.
Folha - A crítica social é uma missão comum a autores e jornalistas?
Poniatowska - Na América Latina, a realidade é tão dura e difícil
que os escritores escrevem sobre
o que acontece. Afinal, a realidade
é mais forte do que qualquer coisa
que se possa inventar, qualquer
ficção pessoal. Isso é importante.
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