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CRÍTICA
Caráter investigativo salta, para o bem e para o mal
DA REPORTAGEM LOCAL
O começo engana. O relato
de como uma mãe pobre,
porém sábia, se esforça com amor
para criar os cinco filhos dignamente pode fazer com que o leitor
brasileiro pense estar diante de
outro livro sentimental, escrito
por outra autora mexicana, literatura açucarada, "para mulher".
É preciso cruzar com perseverança os primeiros capítulos de
"La Piel del Cielo" para que surjam sinais da trajetória combativa
de Elena Poniatowska, que a alça
da prateleira de "literatura feminina" à de autores renomados.
Talvez tenha sido uma aposta
no público feminino a fazer com
que a Objetiva escolhesse justamente "La Piel del Cielo", entre os
cerca de 30 livros de Poniatowska,
para lançar a autora no Brasil.
Não por acaso é a mesma editora que lançou, neste ano, livros
das também mexicanas Laura Esquivel ("Tão Veloz como o Desejo") e Ángeles Mastretta ("Mulheres de Olhos Grandes").
Ambas autoras se alinham mais
com a promessa encetada nos primeiros capítulos do romance do
que com o engajamento político e
a crítica audaciosa que marcaram
outros livros de Poniatowska, como "La Noche de Tlatelolco"; ou a
paciente investigação que permitiu com que biografasse personagens icônicos da história recente
mexicana, como Octavio Paz.
Felizmente, a narrativa toma
ritmo do terceiro capítulo em
diante, com a inclusão de personagens mais nuançadas e acontecimentos mais mundanos, que liberam o leitor do cotidiano no
afastado sítio onde a família de
Florencia -braço bastardo dos
decadentes De Tena- crescia.
A luta por mostrar o México como um país capaz de andar sobre
as próprias pernas é o "leitmotiv"
do romance. Ao mesmo tempo,
impõem-se as dificuldades de
país de Terceiro Mundo -a pobreza, a falta de vontade política.
A qualidade investigativa da
jornalista Poniatowska transparece, para o bem e para o mal, em
"La Piel del Cielo". Para o bem,
por resgatar um trecho amplo da
história mexicana -e conhecer a
história ajuda a vencer preconceitos. Para o mal, pelo excesso de
detalhes com que o faz: às vezes
falta habilidade para mesclar a pequena e a grande história.
Uma vez que o protagonista Lorenzo de Tena ultrapassa as dúvidas e o romantismo da adolescência (sem perder a rebeldia) e, evocando a vocação dos antepassados pré-colombianos, dedica-se à
astronomia, a narrativa toma ritmo e abre espaço para que a autora coloque-se criticamente, na voz
de seus personagens.
No entanto é preciso dizer que,
por vezes, a mão de Poniatowska
pesa: fica difícil acreditar no tamanho da misantropia (e até misoginia) que fazem tão solitário o
esforço de Lorenzo -parcialmente inspirado pelo astrônomo
Guillermo Haro, com quem foi
casada e que, como o personagem, dirigiu os observatórios de
Tonantzintla e Tacubaya.
Não que seja mau livro. Mas o
leitor brasileiro ganharia se a primeira obra de Elena Poniatowska
publicada no país refletisse mais
acuradamente o alcance de sua literatura.
(FRANCESCA ANGIOLILLO)
La Piel del Cielo
Autor: Elena Poniatowska
Editora: Alfaguara
Quanto: US$ 20,76 ou R$ 86 (474 págs.)
Onde encomendar: www.bn.com, www.submarino.com.br
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