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CINEMA
Livro lançado nos Estados Unidos corrige erros históricos e apresenta o cineasta americano como rude e solidário
Biografia sai à procura de John Ford
AMIR LABAKI
ARTICULISTA DA FOLHA
James Stewart costumava dizer:
"Reúna tudo o que você ouviu dizer, multiplique por cem, e ainda
assim não terá um retrato de John
Ford". O crítico norte-americano
Joseph McBride seguiu a fórmula,
durante aplicadas três décadas, e
o resultado é uma monumental e
definitiva biografia em 838 páginas, "Searching for John Ford - A
Life" (Procurando John Ford
-Uma Vida), lançada neste semestre nos EUA.
Para as novas gerações, quando
muito restou a difusa imagem de
John Ford como um antigo diretor de faroestes.
Morto há quase 30 anos, o diretor de "No Tempo das Diligências" (1939) parece hoje enterrado
em enciclopédias de cinema e na
memória de irritantes cinéfilos.
A popularidade de sua obra definhou na razão inversa de seu
prestígio crítico. Sobretudo na última década, a bibliografia fordiana cresce sem parar, enquanto
seus filmes não costumam se dar
mal nos tradicionais levantamentos de melhores de todos os tempos (no mais recente da revista
britânica "Sight & Sound", em
1992, "Rastros de Ódio" emplacou um honroso quinto lugar.
Ford ficou em nono entre os diretores prediletos dos cineastas e
em sexto entre os preferidos da
crítica).
McBride lança agora o mais
obrigatório dos volumes sobre
John Ford. Antes, já contribuíra
para a reavaliação de sua obra
com um competente estudo escrito a quatro mãos com Michael
Wilmington.
Nada se compara ao gigantesco
trabalho para a biografia. McBride visitou das ruínas da casa irlandesa de onde emigrou a família
paterna do diretor para os EUA,
em finais do século 19, ao velório
de seu personagem.
Sua minuciosa reconstituição
torna-se ainda mais impressionante quando se conhece a tradicional resistência de John Ford
em falar sobre si mesmo e suas
obras (McBride bem que tentou,
num episódio hilário recordado
no livro). Pior: mais que levantar
informações, coube ao biógrafo
corrigir as milhares de pistas falsas distribuídas ou estimuladas
pelo próprio Ford em mais de
meio século de carreira em Hollywood.
"Quando a lenda se torna fato,
imprima a lenda", dizia o editor
do jornaleco local de "O Homem
que Matou o Facínora" (1962),
naquele que acabou por cristalizar-se como involuntário lema
fordiano.
No próprio filme, como McBride registra certeiramente, Ford
imprime os fatos, mas a força de
uma nova lenda acabou derrotando o exemplo de seu criador.
Em "Searching for John Ford",
McBride segue o exemplo de seu
protagonista: imprime os fatos.
Será difícil olhar para qualquer
outro estudo fordiano sem desconfianças depois de navegar pelo
quase milhar de detalhistas páginas.
Em especial, revela-se toda a
fragilidade da biografia oficial familiar escrita pelo neto, Dan Ford
("Pappy: The Life of John Ford"),
metodicamente corrigida por
McBride a cada dezena de páginas.
A nova biografia resgata a verdade de episódios que vão do nascimento e batismo de John (e
nunca "Sean") Martin Feeney numa família de mais que remediados imigrantes irlandeses da Nova Inglaterra em 1894 (e não 1895)
até a posição cética (e não patrioteira) frente à Guerra do Vietnã
do cineasta já próximo da morte.
John Ford emerge do livro como um homem rude, diretor carrasco, marido omisso, pai relapso
e beberrão contumaz.
Foi ainda muito mais solidário
com a classe do que se imagina,
muito menos conservador do que
se apregoa, muito mais humano
do que gostaria. Tornou-se, enfim, um personagem à altura da
própria obra. É chegada a hora de
voltar a ela.
Searching for John Ford - A Life
![](http://www.uol.com.br/fsp/images/ep.gif)
Autor: Joseph McBride
Editora: St. Martin's Press
Quanto: US$ 40 (838 págs.)
Onde encomendar: www.amazon.com; www.bn.com
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