São Paulo, domingo, 23 de janeiro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Estudo tira dos trilhos ideologia do progresso

DA REPORTAGEM LOCAL

"Trem-Fantasma" nasceu do meio da poeira. O ano era 1980 e Francisco Foot Hardman estava vasculhando velharias em um sebo de Recife quando encontrou o volume "A Fogueira do Diabo", de Manoel Rodrigues Ferreira.
Mais até do que o tema, que já era de seu interesse, foi uma foto no interior do volume que seduziu o professor, a imagem de um hindu de olhar absorto, turbante e braços cruzados logo abaixo do peito (não por acaso aqui à dir.).
"Fiquei com esse enigma passeando na cabeça. Quem seria aquele hindu", lembra Hardman.
À época um mestre à caça de assunto para seu doutorado, acabou achando a trilha por trás do "ar sóbrio e decidido" daquele trabalhador da Madeira-Mamoré.
Hardman se embarafustou em florestas de livros (são 37 páginas de bibliografia) e de lá saiu após quatro anos com sua tese.
"Trem-Fantasma", transformada em 88 em livro pela então iniciante Companhia das Letras, que agora o reedita, traz no corpo as marcas da trajetória híbrida de seu autor. Formado em ciências sociais, com mestrado em política, na área de história do trabalho, Hardman, hoje professor de teoria e história literária da Unicamp, defendeu seu doutorado no Departamento de Filosofia da USP.
Mais do que uma história ou um ensaio sobre a ferrovia aberta a ferro e sangue, o livro traça um amplo e original painel sobre as raízes da modernidade e sobre como o Brasil, Madeira-Mamoré incluída, se inseriu nesse processo.
A ferrovia aparece como símbolo bem acabado da ideologia do progresso, da expansão violenta do capital e, no caso amazônico, do choque entre o moderno da cidade e o arcaico da floresta.
Para dar conta de temas como esses, Hardman usa instrumental de todas as suas áreas de pesquisa, da filosofia à literatura. Marx é uma das marias-fumaças.
Ele diz que não espera que o público global acompanhe toda a sua sinuosa "estrada de ferro" e especula que a série não deverá ser rigorosa, mas elogia a popularização da informação que deve trazer. "Muita gente que não conheceria esse tipo de coisa vai poder saber que houve numa época, num lugar perdido da Amazônia, um empreendimento que implicou milhares de perdas de vidas."
O professor diz que está com problemas na antena de sua TV, mas que ele mesmo dará um jeito de assistir a "Mad Maria". (CEM)


Texto Anterior: "Mad Maria": TV puxa vagão de relançamentos literários
Próximo Texto: Realidade não foi alvo de inspirador da série
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.