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LANÇAMENTOS/DVD
"UM SÓ CORAÇÃO"
Versão em DVD tem mais de 22 horas da história das elites paulistas e de migrantes até a década de 50
Minissérie é tsunami de lugares-comuns
ALCINO LEITE NETO
EDITOR DE DOMINGO
Na versão em DVD, a minissérie "Um Só Coração" resultou em seis discos, que trazem
1.320 minutos de programa, ou
seja, cerca de 22 horas. É um exagero. Este crítico levou cinco noites infindáveis para assistir à minissérie, que em 2004 foi exibida
na TV de janeiro a abril.
No mesmo período de 22 horas,
o crítico poderia ter visto quatro
vezes o épico "Novecento" (1976),
do diretor italiano Bernardo Bertolucci -as duas partes deste filme somam cerca de cinco horas.
Tanto "Novecento" quanto
"Um Só Coração" têm a veleidade
de querer contar a história de um
povo inteiro por meio da vida de
algumas famílias ao longo do século 20. O filme de Bertolucci vai
até o final da Segunda Guerra -é
um retrato dos italianos divididos
entre fascismo e comunismo. A
minissérie, feita para celebrar os
450 anos de São Paulo, retrata a
história das elites paulistas e de
migrantes até a década de 50.
Não, não vou comparar "esteticamente" o filme e o seriado. Seria
covardia. Mas vale a pena contrastar a sua visão de mundo.
Para Bertolucci, a história é conflito entre ricos e pobres. Os primeiros exploram os últimos, que
lutam para serem menos explorados. É a clássica visão marxista,
ajustada no filme à descrença
atual na revolução comunista. A
luta dos explorados não tem fim.
Em "Um Só Coração" (o nome
já diz), os conflitos não passam de
distúrbios ocasionais na vida da
grande família brasileira, toda ela
unida na emoção de construir o
país. Não se apoquente com o futuro: entregue seu destino à linda
telehistória do Brasil. No final, pobres ficarão ricos, ricos ficarão
pobres -e o mais importante: todos serão felizes, até os mortos.
Para o espectador, há nítida
vantagem na visão da Globo: ao
transformar a história em telenovela, a emissora acaba prometendo um "happy end" para a própria realidade ingrata. Mas convenhamos que tudo isso é uma
grande e espalhafatosa mentira,
ao passo que Bertolucci está preocupado em não nos iludir demais.
"Os frutos do trabalho de Yolanda (Penteado) e Ciccilo (Matarazzo) são usufruídos pelos milhões de pessoas de todas as raças
e origens que vivem em São Paulo, irmanadas por uma só vontade
e unidas em um só coração." É
com essa frase pomposa e infame
que termina a minissérie.
Além de ser ideologicamente
traiçoeiro, "Um Só Coração" é esteticamente reacionário. É um
tsunami de lugares-comuns, uma
superprodução de clichês da história paulista, um megamonumento ao provincianismo.
Mas há um motivo ao menos
para assistir à minissérie: o elenco
é dos melhores já reunidos pela
Globo. Os atores conduzem o
programa com graça e emoção legítima, espantando um pouco o
cheiro nauseante de naftalina.
Mas o material extra é medíocre. Só traz reportagens com os
atores, no estilo "Vídeo Show".
Um Só Coração
Lançamento: Som Livre, R$ 200, em
média
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